A Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho considerou regular a impugnação aos cálculos de execução de sentença que a Sanofi – Aventis Farmacêutica Ltda. apresentou dentro de prazo equivocadamente concedido por juiz. Segundo a relatora, ministra Maria de Assis Calsing, entendimento em sentido contrário afronta os princípios da segurança jurídica e do devido processo legal.
Condenada a pagar horas extras e FGTS a um representante comercial, a empresa impugnou, no penúltimo dia do prazo correto, o cálculo do valor a ser pago. Cerca de um mês depois, o juízo da 25ª Vara do Trabalho de Salvador (BA) indeferiu o pedido, mas, no próprio despacho, autorizou a Sanofi a reanalisar os cálculos em mais 10 dias. No entanto, a nova impugnação, apresentada dentro do prazo concedido, não foi admitida. Segundo o juízo, houve “mero equívoco” na concessão de mais tempo, e o verdadeiro prazo havia expirado.
O Tribunal Regional do Trabalho da 5ª Região manteve o indeferimento. Segundo o TRT, o juiz foi claro ao admitir o equívoco, e não houve o erro alegado pela Sanofi, que em nenhum momento requereu o aumento do prazo.
No recurso de revista, o laboratório sustentou que, no momento em que o juízo de origem concedeu o prazo de 10 dias para manifestação, o recorrente adquiriu o direito a ele, e não poderia ser tolhido “sem qualquer aviso ou, pior, fundamentação”. Segundo a empresa, o despacho que concedeu o prazo, ao ser publicado em Diário Oficial, transformou-se em ato jurídico perfeito, “produzindo, por tal, todos os efeitos legais”.
A relatora do recurso, ministra Maria de Assis Calsing, entendeu que o TRT afrontou os princípios da segurança jurídica e do devido processo legal. Ela destacou que a decisão do juízo da Vara do Trabalho foi expressa ao reabrir o prazo para a impugnação dos cálculos.
Para a ministra, a Sanofi não pode ser surpreendida com a não admissão de sua contradita por intempestividade com a justificativa de que o aumento do prazo foi equivocado. “O procedimento da empresa teve respaldo em determinação judicial, que sequer foi impugnada pela outra parte”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. AVISO PRÉVIO ADICIONAL. APLICAÇÃO DA NORMA COLETIVA DA BASE TERRITORIAL DE ATUAÇÃO DO RECLAMANTE. HORAS EXTRAS. FGTS. DIFERENÇAS. RECONHECIMENTO DA RELAÇÃO DE EMPREGO. DESPACHO MANTIDO POR SEUS PRÓPRIOS FUNDAMENTOS. A despeito das razões expostas pela parte agravante, merece ser mantido o despacho que negou seguimento ao Recurso de Revista, pois subsistentes os seus fundamentos. Agravo de Instrumento conhecido e desprovido.
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. RECURSO INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI N.º 13.015/2014. EXECUÇÃO. SENTENÇA DE LIQUIDAÇÃO. IMPUGNAÇÃO DA EXECUTADA NÃO CONHECIDA POR INTEMPESTIVIDADE. AGRAVO DE PETIÇÃO. IRRECORRIBILIDADE IMEDIATA. Em que pese o artigo 884, § 3.º, da CLT se refira à sentença, a decisão que homologa os cálculos deve ser vista como decisão interlocutória. Isso porque a deliberação não põe fim ao trâmite da liquidação, tendo em vista a possibilidade de novas impugnações, que, no caso do devedor, se dará por meio dos Embargos à Execução. Registre-se, por oportuno, que, em casos específicos, doutrina e jurisprudência têm admitido a recorribilidade imediata da decisão que homologa os cálculos, como, por exemplo, em situações em que o comando decisório encerra o próprio processo. Ocorre que este não é o caso dos autos, visto que a sentença de liquidação apenas homologou os cálculos, sem apreciar o mérito da controvérsia. E, havendo a possibilidade de impugnação dos cálculos homologados nos Embargos à Execução, não há de se falar em violação dos princípios do contraditório e da ampla defesa. Agravo de Instrumento conhecido e não provido.
AGRAVO DE INSTRUMENTO EM RECURSO DE REVISTA. IMPUGNAÇÃO AOS CÁLCULOS. TEMPESTIVIDADE. Demonstrada violação de norma constitucional (artigo 5.º, LIV, da CF/88), nos termos do artigo 896, “c”, da CLT, determina-se o processamento do Recurso de Revista. Agravo de Instrumento conhecido e provido. RECURSO DE REVISTA. IMPUGNAÇÃO AOS CÁLCULOS. TEMPESTIVIDADE. Cinge-se a controvérsia a determinar se a decisão que reabre o prazo para a impugnação dos cálculos, ainda que por um equívoco, garante à parte litigante o direito de apresentação da referida impugnação dentro do novo limite temporal. Não pode a parte recorrente ser surpreendida com a não admissão de sua contradita, por intempestividade, sob o argumento de que a determinação de dilação do prazo foi equivocada. O procedimento da Reclamada tem respaldo em determinação judicial, a qual sequer foi impugnada. Entendimento em contrário afronta os princípios da segurança jurídica e do devido processo legal. Recurso de Revista conhecido e provido.
Por unanimidade, a Quarta Turma acompanhou a relatora. O representante comercial opôs embargos de declaração, mas eles não foram acolhidos.
Processo: RR-230-55.2010.5.05.0025