A Defensoria estadual somente poderia ajuizar a ação mediante convênio com a Defensoria Pública da União
A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho considerou que a Defensoria Pública do Estado do Amazonas (DP-AM) não tem legitimidade para postular, em nome próprio, direitos de trabalhadores atingidos por decisão do Tribunal Regional do Trabalho da 11ª Região (AM). Por unanimidade, o colegiado concluiu que as Defensorias Públicas estaduais só estão autorizadas a atuar, na Justiça do Trabalho, na condição de representantes processuais da Defensoria Pública da União (DPU), pois só têm legitimação para atuar nos graus de jurisdição e nas instâncias administrativas dos estados.
Acordo
Em 2008, o Ministério Público do Trabalho (MPT) e o Ministério Público do Estado do Amazonas ajuizaram ação civil pública contra a Fundação Televisão e Rádio Cultura do Amazonas (Funtec), na qual foi firmado acordo que estabelecia as condições para o desligamento de cerca de 100 empregados admitidos sem concurso público e sua substituição por concursados.
Após o esgotamento dos recursos (trânsito em julgado), a Defensoria Pública estadual ajuizou ação rescisória, visando à desconstituição da sentença homologatória. Segundo a DP-AM, a execução do acordo causaria prejuízos irreparáveis aos trabalhadores que seriam desligados.
Ação rescisória
A ação foi julgada procedente pelo TRT, que reconheceu a legitimidade da DP-AM. O acordo foi anulado com o fundamento de que o sindicato que representa os empregados envolvidos não fora admitido como parte no processo pelo juízo de primeiro grau.
Contra essa decisão, o MPT e o Estado do Amazonas interpuseram recursos ordinários ao TST, sustentando que a Defensoria Pública do Estado careceria de legitimidade para propor a ação na Justiça do Trabalho.
Convênio
O relator dos recursos, ministro Dezena da Silva, explicou que, em termos de estruturação funcional, a Defensoria Pública é constituída pela DPU e pelas Defensorias Públicas dos estados e do Distrito Federal e dos territórios, cada uma com seu rol específico de atribuições. A Lei Complementar 80/1994, que organiza as defensorias, prevê, no artigo 14, que a legitimação para atuar na Justiça do Trabalho, em substituição processual, é da DPU. Já o parágrafo 1º do dispositivo prevê a possibilidade de as Defensorias estaduais atuarem em nome da DPU nos órgãos de primeiro e segundo graus de jurisdição, por meio de convênios firmados especificamente para essa finalidade. No caso, porém, não consta nos autos registro de convênio.
Terceiro interessado
Outro ponto destacado pelo relator é que o ordenamento jurídico confere legitimidade para propositura de ação rescisória às partes do processo originário, ao terceiro juridicamente interessado e ao Ministério Público. “A Defensoria Pública não se apresenta como terceira interessada”, afirmou. Segundo ele, os terceiros interessados, no caso, são os trabalhadores atingidos pela decisão desfavorável, que não fizeram parte da ação civil pública originária.
Por unanimidade, a SDI-2 reconheceu a ilegitimidade da DP-AM e extinguiu a ação rescisória, cassando, assim, liminar deferida pelo TRT.
O recurso ficou assim ementado:
AÇÃO RESCISÓRIA AJUIZADA NA VIGÊNCIA DO CPC DE 1973. RECURSOS ORDINÁRIOS DO MINISTÉRIO PÚBLICO DO TRABALHO DA 11.ª REGIÃO E DO ESTADO DO AMAZONAS. MATÉRIA COMUM. ILEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO AMAZONAS. CARÊNCIA DE AÇÃO CONFIGURADA. À luz do disposto no art. 487 do CPC de 1973, a atuação da Defensoria deve ser analisada pelo prisma da legitimidade ad causam, ou seja, é preciso aferir se a Defensoria Pública estava autorizada por lei a postular, em nome próprio, a defesa de direito alheio. Em termos de estruturação funcional, a Defensoria Pública é constituída pela Defensoria Pública da União, Defensoria Pública dos Estados e Defensoria Pública do Distrito Federal e dos Territórios (art. 2.º da LC n.º 80/94), cada qual com seu rol específico de atribuições. Nesse diapasão, a legitimação extraordinária para atuar na Justiça do Trabalho, em substituição processual, é conferida à Defensoria Pública da União, nos termos do art. 14 da Lei Complementar n.º 80. Já o § 1.º do referido dispositivo legal, por sua vez, prevê a possibilidade de as Defensorias Públicas dos Estados atuarem em nome da Defensoria Pública da União nos órgãos de primeiro e segundo graus de jurisdição, por meio de convênios firmados especificamente para essa finalidade. Pode-se afirmar, portanto, que as Defensorias Públicas dos Estados só estão autorizadas a atuarem na Justiça do Trabalho na condição de representantes processuais da Defensoria Pública da União, na medida em que as Defensorias Públicas Estaduais só possuem legitimação para atuar nos graus de jurisdição e instâncias administrativas dos Estados, consoante definido no art. 106 da Lei Complementar n.º 80/94. A partir de tais fundamentos é forçoso concluir que a autora não possui legitimação extraordinária para postular, em nome próprio, direitos pertencentes aos trabalhadores atingidos pelos efeitos da decisão rescindenda, seja porque sua atuação neste feito não se deu no âmbito da jurisdição estadual, isto é, não se trata aqui de hipótese inserida na permissão contida no art. 106 da Lei Complementar n.º 80/94, seja porque não consta dos autos registro de convênio celebrado entre a autora e a Defensoria Pública da União, nos moldes preconizados pelo § 1.º do art. 14 da LC n.º 80/94, a autorizá-la a atuar na Justiça do Trabalho. Consequentemente, impõe-se o decreto de carência da ação, com a extinção do feito sem julgamento de mérito, na forma do art. 267, VI, do CPC de 1973. Recursos Ordinários conhecidos e providos.
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Processo: RO-371-84.2010.5.11.0000