A 5ª Quinta Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) decidiu que um servidor do Ministério da Agricultura que foi reintegrado ao cargo de agente fitossanitário, após perseguição política na ditadura militar, tem direito à indenização por danos morais e materiais em razão de suposta perseguição política sofrida. Essa situação aconteceu quando vigorou no Brasil o regime de exceção. A sentença determinou o pagamento por danos materiais no valor equivalente a 50% da remuneração mensal a que o autor teria direito no período de 10/06/1980 até seu retorno ao cargo público e por danos morais no valor de R$ 300.000,00.
Na apelação, a União defendeu que o Poder Judiciário não deve interferir na decisão da Comissão de Anistia do Ministério da Justiça, que somente reconheceu a condição de anistiado do autor e o reintegrou ao cargo que ocupava antes de ser destituído pelo regime de exceção. Alegou o ente público que o pedido de indenização prescreveu de acordo com o Decreto nº 20.910 de 1932 e a Constituição Federal. Destacou que o artigo 16 da Lei nº 10.559 de 2002 veda a acumulação de benefícios, pagamentos ou indenizações com o mesmo fundamento. Indicou que inexistem, nos autos, provas de qualquer dano moral ou material suportado pelo autor. Por fim, pediu a aplicação do artigo 1º ‘F’ da Lei nº 9.494 de 1997 para fins de atualização do valor da condenação.
O relator, juiz federal convocado Ilan Presser, ao analisar o caso, destacou que deve ser afastada a preliminar de prescrição invocada pela apelante, tendo em vista o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Segundo essa Corte, são imprescritíveis as ações de reparação por danos sofridos em razão de perseguição, tortura e prisão por motivos políticos.
Quanto ao mérito, o magistrado ressaltou a destituição do autor do cargo público que ocupava. A saída do servidor ocorreu em virtude de razões políticas que lhe causaram flagrante e injustificado dano material, uma vez que ele deixou de exercer sua função por mais de três décadas. “Na espécie, a reparação econômica arbitrada na origem em 50% da remuneração que receberia o autor, se em exercício estivesse, até sua reintegração ao cargo, é devida não como pagamento de salários retroativos, mas como parâmetro de fixação do dano material suportado pelo anistiado”, explicou o relator.
Quanto aos alegados danos morais, o juiz federal convocado sustentou que “não há como negar que as ações do Estado, a partir da instalação do governo militar em 1964, provocaram profundos abalos nos direitos fundamentais e na vida pessoal de milhares de brasileiros”. Na hipótese, asseverou o magistrado, acham-se plenamente demonstrados os danos morais decorrentes do atraso injustificado na reintegração de autor ao serviço público, e o nexo causal, ficando configurado, portanto, o dever de indenizar do Estado.
Desse modo, concluiu o magistrado, não merece reparos a sentença que condenou a União ao pagamento de indenização pelo dano moral, que, como já salientado, ficou evidenciado nos autos, devendo incidir a regra prevista no art. 37, § 6º, da CF/88.
O Colegiado, acompanhando o voto do relator, deu parcial provimento à apelação da União somente para fixar o valor dos danos morais em R$ 100.000,00.
O recurso ficou assim ementado:
CONSTITUCIONAL. CIVIL. REGIME DE EXCEÇÃO. PERSEGUIÇÃO POLÍTICA. DESTITUIÇÃO DE CARGO PÚBLICO. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. INOCORRÊNCIA DE PRESCRIÇÃO. INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. FIXAÇÃO DO QUANTUM INDENIZATÓRIO COM BASE NOS VENCIMENTOS DO CARGO. POSSIBILIDADE. DANOS MORAIS. REDUÇÃO DO MONTANTE FIXADO NA INSTÂNCIA DE ORIGEM. MÉTODO BIFÁSICO. SENTENÇA PARCIALMENTE REFORMADA.
I – Conforme jurisprudência pacificada no âmbito do Superior Tribunal de Justiça, é imprescritível a pretensão indenizatória por danos decorrentes da violação a direitos fundamentais no período da Ditadura Militar.
II – “Com vistas no princípio da responsabilidade civil objetiva do Estado, com apoio na Teoria do Risco Administrativo, afigura-se cabível indenização por dano moral e/ou material a anistiado político e/ou a dependente, a quem foi infligido tratamento que atingiu as suas esferas física e psíquica, resultando, daí, na violação de direitos constitucionalmente garantidos e protegidos (CF, art. 5º, X). Assim, comprovado o nexo de causalidade entre o dano e a atuação estatal, incide a regra prevista no art. 37, § 6º, da Carta Política Federal de 1988” (AC 0025525-45.2012.4.01.3800/MG, Rel. DESEMBARGADOR FEDERAL SOUZA PRUDENTE, QUINTA TURMA, e-DJF1 de 03/04/2018).
III – São distintos os fundamentos da reparação econômica devida aos anistiados políticos e da indenização a título de danos morais, ainda que amparados no mesmo fato gerador, tratando-se, portanto, verbas cumuláveis. Precedentes.
IV – Esta egrégia Corte Regional possui entendimento jurisprudencial no sentido de que não caracteriza violação à Lei de Anistia o pagamento de indenização decorrente da destituição indevida de servidor por motivações políticas, tomando-se por referência, para fins de definição do quantum indenizatório, o valor correspondente aos vencimentos a que faria jus se em exercício estivesse, por não se tratar de pagamento retroativo de remuneração, mas apenas critério de fixação do dano material suportado.
V – Considerando o método bifásico adotado pelo STJ (REsp 1332366/MS, Rel. MINISTRO LUIS FELIPE SALOMÃO, QUARTA TURMA, e-DJF1 de 07/12/2016), tem-se como razoável o valor de R$ 100.000,00 (cem mil reais) a título de danos morais, tomando por parâmetro de comparação casos semelhantes já julgados por esta Corte Regional.
VI – Apelação e remessa oficial parcialmente providas. Sentença parcialmente reformada.
Processo nº: 0053962-35.2012.4.01.3400