TRF1 mantém decisão de recebimento de inicial e de citação de acusado em ação de improbidade administrativa

A 4ª Turma do Tribunal Regional Federa da 1ª Região (TRF1) manteve a decisão de recebimento da petição inicial em ação civil pública, ajuizada pelo Ministério Público Federal (MPF). A ação visa apuração de supostas fraudes ocorridas em procedimentos licitatórios realizados no Município de Cáceres/MT.

Ao recorrer, o agravante sustentou que o juiz fundamentou a decisão no princípio in dubio pro societate, não apresentando os motivos que formaram o seu convencimento. Prosseguiu argumentando que a única atuação na licitação, como procurador do município, foi a emissão de parecer favorável à homologação, não havendo prova de que o agravante teria agido junto com outras pessoas para o ato de improbidade, nem configuração de dolo ou erro grave inescusável. Ao final pediu o reconhecimento de plano da improcedência da ação, nos termos o art. 17, § 8º, da Lei 8.429/1992, que dispõe sobre as sanções aplicáveis aos agentes públicos nos casos de enriquecimento ilícito no exercício de mandato.

Analisando o processo, o relator, desembargador federal Néviton Guedes, verificou que “conforme se depreende da inicial da ação de improbidade e da decisão agravada, há fundados indícios da prática de atos de improbidade administrativa, o que, a teor do § 8º, art. 17, da Lei 8.429/1992, desautoriza a rejeição liminar da ação”.

Prosseguindo, o magistrado explicou que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta-se no sentido de que o parecer opinativo só pode ser considerado ato ímprobo se redigido com erro grosseiro ou má-fé, mas que, no caso concreto, a petição inicial afirmou que o agravante elaborava os pareceres e orientava os gestores públicos sobre como proceder nas licitações fraudulentas.

Concluindo o voto, o relator destacou que o Supremo Tribunal Federal decidiu, em sede de repercussão geral, que “o art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão”.

O recurso ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA. PREFEITURA MUNICIPAL. ALEGADA FRAUDE E OUTRAS IRREGULARIDADES EM PROCEDIMENTOS LICITATÓRIOS. AQUISIÇÃO DE MEDICAMENTOS. INDÍCIOS DE PARTICIPAÇÃO DO PROCURADOR MUNICIPAL. NECESSIDADE DE INSTRUÇÃO PROCESSUAL. RECEBIMENTO DA INICIAL. DECISÃO MANTIDA. AGRAVO DESPROVIDO.

1. Agravo de instrumento interposto contra decisão que, nos autos de ação civil pública de improbidade administrativa ajuizada pelo Ministério Público Federal em desfavor do agravante e outros, recebeu a inicial e determinou a citação dos requeridos para apuração de supostas fraudes ocorridas em procedimentos licitatórios realizados no Município de Cáceres/MT.

2. Na inicial da ação civil pública, narra o MPF, com base no Inquérito Policial nº 671-65.2013.4.01.3601, instaurado pela Polícia Federal com o objetivo de apurar de possíveis irregularidades praticadas por servidores lotados na Secretaria Municipal de Saúde de Cáceres/MT, que os servidores, em conluio com representantes de empresas distribuidoras de medicamentos, produtos hospitalares e odontológicos, fraudavam procedimentos licitatórios destinados à compra de tais bens, bem como desviavam/apropriavam-se dos fármacos e os revendiam/repassavam aos proprietários de drogarias locais e terceiros.

3. Sustenta que a então Secretária de Saúde do município destacou um servidor para a coleta dos orçamentos e o estabelecimento dos preços de referência superdimensionados para licitação e, ao final, homologou o procedimento licitatório e adjudicou o objeto à empresa vencedora, autorizando o empenho das respectivas despesas, encaminhando, após, o procedimento à Procuradoria-Geral do Município para análise, tendo o agravante, na condição de procurador municipal, chancelado a suposta regularidade do certame e avalizado a formalização da avença com a empresa vencedora, celebrando-se o contrato administrativo n. 139/2012-PGM.

4. Destaca que o agravante, procurador municipal, “não só tinha ciência das irregularidades ocorridas na pasta de Saúde como orientava Arleme Janissara e Jocenildo a como procederem nas licitações fraudulentas desencadeadas pela secretaria [áudios interceptados n. 4346421 e 4372300]”, além de que “confeccionava pareceres favoráveis aos processos licitatórios viciados e viabilizava, assim, os desvios de verbas públicas destinadas às ações e serviços de Saúde no município”.

5. Conforme se depreende da inicial da ação de improbidade e da decisão agravada, há fundados indícios da prática de atos de improbidade administrativa, o que, a teor do § 8º, art. 17, da Lei 8.429/92, desautoriza a rejeição liminar da ação, uma vez que não demonstrada cabalmente a improcedência da ação, a inexistência do ato de improbidade administrativa ou a inadequação da via eleita, devendo o feito, assim, ter regular prosseguimento para apuração mais aprofundada dos fatos que resultaram na propositura da ação civil pública.

6. Logo, tendo o magistrado prolator da decisão agravada demonstrado na decisão impugnada, ainda que minimamente, evidências da prática de crime de responsabilidade por parte do agravante, o recebimento da ação civil pública era medida que se impunha, uma vez que há indícios de que o recorrente, então procurador municipal, “figurava como importante interlocutor de Arleme Janissara de Oliveira Alcântara, secretária de Saúde à época dos fatos e principal articuladora do esquema ilegal de compras de medicamentos existente na pasta”, conforme áudios captados pela Polícia Federal em interceptações telefônicas.

7. É verdade que a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça orienta no sentido de que o parecer opinativo, ainda que equivocado, somente pode ser considerado como instrumento de um ato ímprobo se demonstrado que foi redigido com erro grosseiro ou má-fé, uma vez que o advogado parecerista está protegido pela inviolabilidade dos atos praticados no exercício de sua profissão, a teor do art. 2º, § 3º, da Lei 8.906/1994. Precedente do STJ: AgInt no AREsp 1.318.886/MS, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe 08/08/2019.

8. Ocorre que a inicial da ação de improbidade afirma não apenas que o agravante supostamente elaborava de pareceres favoráveis aos processos licitatórios viciados, mas que o então procurador municipal também orientava os gestores públicos a como proceder nas licitações fraudulentas desencadeadas pela secretaria de saúde, conforme constatado em interceptações telefônicas.

9. A questão acerca da ausência de participação do procurador municipal nos atos tidos como ímprobos deverá ser esclarecida por ocasião da instrução processual, quando se poderá perquirir com maior profundidade as supostas práticas de atos ilegais por parte de todos os requeridos, não sendo, pois, suscetível de apreciação nessa fase processual.

10. No que diz respeito à alegada ausência de fundamentação da decisão impugnada, o Supremo Tribunal Federal assentou, em sede de repercussão geral, que: “O art. 93, IX, da Constituição Federal exige que o acórdão ou decisão sejam fundamentados, ainda que sucintamente, sem determinar, contudo, o exame pormenorizado de cada uma das alegações ou provas, nem que sejam corretos os fundamentos da decisão” (AI 791.292 QO-RG/PE, Rel. Ministro Gilmar Mendes, Pleno, DJe-149 DIVULG 12-08-2010 PUBLIC 13-08-2010).

11.Agravo de instrumento do requerido a que se nega provimento.

Processo 1027568-08.2020.4.01.0000

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