Sócio que saiu da empresa 12 dias após sua venda não deverá responder por dívida da compradora

Para a 7ª Turma, sua responsabilização ofende o direito de propriedade 

A Sétima Turma do Tribunal Superior do Trabalho excluiu um ex-sócio da Camargo Campos S.A. Engenharia e Comércio, de São Paulo (SP), da execução de sentença trabalhista em ação movida por um carpinteiro. Como ele havia figurado na sociedade por apenas 12 dias na vigência do contrato de trabalho, o colegiado entendeu que sua responsabilização pelas dívidas ofende o direito de propriedade.

Condenação

A reclamação trabalhista foi ajuizada em 2013 pelo carpinteiro contra a Singulare Pré-Moldados em Concreto Ltda. e a Camargo Campos, que, em agosto de 2011, fora vendida à Singulare e passara a integrar o mesmo grupo econômico.

Em 2015, as empresas fizeram um acordo para o pagamento de R$ 35 mil ao empregado, em dez parcelas. Como o combinado não foi cumprido, a execução foi direcionada aos sócios das duas empresas.

Bloqueio de bens

Um dos ex-sócios da Camargo Campos recorreu ao Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região (SP), alegando que haviam sido bloqueados R$ 74 mil de suas contas bancárias sem que ele tivesse sido citado ou tomado ciência de que estaria sendo cobrado na ação. Segundo ele, a venda da sua empresa à Singulare ocorrera em 4/8/2011, e, em 16/8, ele havia saído da sociedade. Sustentou, ainda, que a Camargo Campos, na época, não tinha nenhum empregado e, portanto, não se beneficiara da força de trabalho do carpinteiro.

Sociedade durante o vínculo

Contudo, o TRT manteve a penhora. Segundo a decisão, a participação do sócio no quadro societário fora, ao menos em parte, contemporânea ao contrato de trabalho, e, diante da inadimplência da empresa, a responsabilidade deveria recair sobre o sócio retirante, que teria se beneficiado da mão de obra do trabalhador.

Direito de propriedade

O relator do recurso de revista do sócio, ministro Evandro Valadão, observou que o período de 12 dias (de 4 a 16 de agosto de 2011) decorrido entre a venda da empresa e sua respectiva averbação não permite a invasão do patrimônio do sócio retirante. “Nesse curto intervalo de tempo, ele não poderia intervir no destino do grupo econômico então formado, principalmente levando em conta seu ânimo de sair da sociedade então constituída”, ressaltou. “Nesse contexto, independentemente de ter havido ou não formação de grupo econômico, não se pode responsabilizar o sócio alienante”.

Para o ministro, nessa circunstância, sua responsabilização pelos créditos trabalhistas de empregado da empresa compradora configura ofensa direta ao direito de propriedade (artigo 5°,inciso  XXII, da Constituição da República).

O recurso ficou assim ementado:

I – EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. AGRAVO INTERNO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LLEI N° 13.105/2015 E ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. OMISSÃO EXISTENTE. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. RESPONSABILIDADE DO EX-SÓCIO. VIOLAÇÃO DIRETA DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA.

I. Hipótese em que foi constatada omissão no julgamento do agravo interno quanto ao exame da alegação de violação direta do art. 5º, XXII, da Constituição da República.

II. No caso em análise, ao assentar que ” nesse contexto não se evidencia violação direta dos arts. 1º, IV, e 5º, II, XXII, LIV e LV, da Constituição da República “, e afastar em bloco a apontada violação de preceitos constitucionais, não se analisou especificamente a ofensa ao direito de propriedade de que trata o inciso XXII do art. 5º da Constituição da República.

III. Embargos de declaração conhecidos e acolhidos, para sanar omissão, com a concessão de efeito modificativo, para reformar a decisão proferida em agravo interno e passar ao exame do agravo de instrumento.

II. AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI N° 13.105/2015 E ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. OMISSÃO EXISTENTE. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. RESPONSABILIDADE DO EX-SÓCIO.

I. A Autoridade Regional negou seguimento ao recurso de revista interposto pelo Reclamante, quanto ao valor da indenização por danos materiais, na forma de pensão mensal, porque entendeu que, ” à vista da expressa prestação jurisdicional, verifica-se que a circunstância em que se deu o deslinde da controvérsia em debate tem contornos exclusivamente infraconstitucionais, fator que impossibilita a constatação de ofensa direta e literal de disposição da Constituição Federal, apta a dar ensejo ao processamento da Revista “.

II. Na minuta de agravo de instrumento, a parte Executada insiste no processamento do recurso de revista, por violação dos arts. 1º, IV e 5º, II, XXII, LIV e LV , da Constituição da República.

III. Demonstrada possível violação do art. 5º, XXII, da Constituição da República.

IV. Agravo de instrumento interposto pela parte executada a que se dá provimento, a fim de determinar o processamento do recurso de revista, observando-se o disposto na Resolução Administrativa nº 928/2003 do TST.

III. RECURSO DE REVISTA. ACÓRDÃO REGIONAL PUBLICADO NA VIGÊNCIA DA LEI N° 13.105/2015 E ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.467/2017. OMISSÃO EXISTENTE. EXECUÇÃO DE SENTENÇA. RESPONSABILIDADE DO EX-SÓCIO.

I. Extrai-se do acórdão regional que as datas de em que houve a aquisição da empresa da qual a parte recorrente era sócio (04/08/2011), a data da formalização de sua saída (16/08/2011), em conjunto com a informação incontroversa que a parte reclamante, ora exequente, era empregado da empresa SINGULARE PRÉ-MOLDADOS EM CONCRETO LTDA., que adquiriu a empresa CAMARGO CAMPOS S.A. ENGENHARIA E COMÉRCIO do sócio retirante, levaram o Tribunal Regional a concluir que, ” tendo em vista que a participação do agravante no quadro societário foi, ao menos em parte, contemporâneo ao contrato de trabalho, e diante da insolvência da reclamada para adimplir o crédito alimentar, é induvidosa a responsabilidade do sócio retirante, que decorre do simples fato de ter se beneficiado da mão de obra do agravado “.

II. Assim, por ter formado grupo econômico com a empresa adquirente que adquiriu a empresa CAMARGO CAMPOS S.A. ENGENHARIA E COMÉRCIO , a empresa vendida pelo ora agravante foi incluída no polo passivo da reclamação trabalhista ajuizada pelo empregado daquela empresa SINGULARE PRÉ-MOLDADOS EM CONCRETO LTDA. Considerando o curto interregno de 12 dias em que o vendedor da empresa figurou como sócio da empresa, a sua responsabilização pelos créditos trabalhistas de empregado da empresa compradora configura ofensa direta ao direito de propriedade tutelado pelo art. 5°, XXII, da Constituição da República.

III. Nesse contexto, independentemente de ter havido ou não formação de grupo econômico, não se pode responsabilizar sócio alienante por um período de doze dias de concomitância de possível grupo econômico.

IV. Não há discussão sobre fraude.

V. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento.

A decisão foi unânime.

Processo: RR-913-54.2013.5.02.0063

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