Seguro-viagem não é responsável por continuidade do tratamento médico após retorno do segurado ao Brasil

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, entendeu que, salvo disposição contratual, a seguradora de viagem não pode ser responsabilizada pelos gastos com tratamento médico realizado no Brasil em razão de acidente sofrido pelo segurado durante sua permanência no exterior.

No caso analisado pelo colegiado, uma consumidora firmou contrato de seguro internacional para viagem à França no período de 19 a 26 de janeiro de 2019. Um dia antes de retornar ao Brasil, fraturou o punho esquerdo ao sofrer uma queda no metrô de Paris.

Como a viagem de volta seria pouco tempo depois, o médico francês optou por imobilizar o punho da paciente e recomendar que ela procurasse um cirurgião em sua cidade de origem, local onde foi feita a operação.

Cobertura era para tratamentos necessários à estabilização do quadro de saúde

Em primeira instância, foi determinado o reembolso apenas do valor gasto com medicamentos no exterior. O Tribunal de Justiça do Paraná (TJPR) negou o recurso da consumidora por entender que o contrato previa expressamente que a cobertura era apenas para os tratamentos necessários à estabilização do quadro de saúde.

Ao STJ, a segurada alegou ser abusivo o seguro que tenha garantia de cobertura apenas para curativos e procedimentos paliativos.

Ao proferir seu voto, o relator do processo na Terceira Turma, ministro Marco Aurélio Bellizze, considerou que não houve atitude abusiva por parte da seguradora, pois a segurada se submeteu aos exames necessários e recebeu atendimento médico no hospital que lhe foi indicado pela companhia.

Contrato excluía a continuidade de tratamento médico no Brasil

“É da natureza do contrato de seguro-viagem que a cobertura para despesas médico-hospitalares seja limitada ao tratamento do quadro clínico de urgência ou emergência do contratante, até a sua efetiva estabilização, a fim de que possa continuar a viagem ou retornar ao local de sua residência, com segurança – o que efetivamente ocorreu no presente caso”, disse o relator.

Bellizze ressaltou que, no contrato firmado entre as partes, havia cláusula que excluía expressamente a continuidade de tratamento médico no Brasil. Sendo assim, após a alta médica dada pelo hospital que prestou o atendimento no exterior, as despesas não estavam mais cobertas pelo seguro.

“Caso a autora não pudesse retornar ao Brasil com segurança, considerando a necessidade de realização imediata da cirurgia, a seguradora teria que cobrir as despesas médicas, no limite do valor da apólice contratada, até a efetiva estabilização de seu quadro clínico. Porém, essa situação também acabaria gerando mais despesas à contratante, pois teria gastos com remarcação do voo, alimentação, hospedagem, entre outros”, concluiu o ministro.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. AÇÃO DE COBRANÇA. SEGURO VIAGEM. AUTORA QUE SOFREU UMA QUEDA NO METRÔ DE PARIS, UM DIA ANTES DO RETORNO AO BRASIL, TENDO FRATURADO O PUNHO ESQUERDO. ATENDIMENTO MÉDICO DEVIDAMENTE REALIZADO NO EXTERIOR CUSTEADO PELA SEGURADORA RECORRIDA. ALTA MÉDICA REALIZADA ALGUMAS HORAS ANTES DO VOO DE RETORNO. CIÊNCIA DA VIAGEM PELO MÉDICO LOCAL, QUE, APÓS A REALIZAÇÃO DE EXAMES CLÍNICOS E DE RADIOGRAFIA, IMOBILIZOU O BRAÇO DA SEGURADA E RECOMENDOU CONSULTA COM CIRURGIÃO NO PAÍS DE RESIDÊNCIA. CONTINUIDADE DO TRATAMENTO MÉDICO REALIZADO NO BRASIL. EXCLUSÃO DE COBERTURA. CLÁUSULA CONTRATUAL EXPRESSA. AUSÊNCIA DE ABUSIVIDADE. MANUTENÇÃO DO ACÓRDÃO RECORRIDO. RECURSO DESPROVIDO.
1. A controvérsia instaurada no presente recurso especial consiste em saber se a seguradora recorrida deve ser responsabilizada pelos gastos decorrentes do tratamento médico realizado pela recorrente no Brasil, em razão de acidente ocorrido durante viagem ao exterior.
2. Na hipótese, a autora celebrou com a seguradora ré contrato de seguro internacional para viagem à França, no período de 19 a 26 de janeiro de 2019. Ocorre que, um dia antes de retornar ao Brasil, sofreu uma queda no metrô de Paris, que lhe causou uma fratura no punho esquerdo. No mesmo dia, foi devidamente atendida em hospital indicado pela seguradora, sendo que, em razão da ausência de gravidade da situação e levando em conta o fato de que voltaria ao Brasil apenas algumas horas depois, o médico francês optou por imobilizar o punho da paciente, com recomendação de que a mesma procurasse um cirurgião em sua cidade de origem, não havendo nos autos qualquer indício de que o atendimento ocorrido tenha sido equivocado, destacando-se, ainda, que todas as despesas foram custeadas pela seguradora.
3. O contrato de seguro viagem abrange, como regra, apenas as despesas médico-hospitalares limitadas ao tratamento de urgência ou emergência do segurado, até a sua efetiva estabilização, a fim de que possa continuar a viagem ou retornar ao local de sua residência com segurança. Logo, é da natureza da respectiva avença que, caso haja a necessidade de continuação do tratamento médico no país de residência do contratante, após a alta médica dada pelo hospital que prestou o atendimento no exterior, as despesas daí decorrentes não estarão cobertas pelo respectivo seguro, salvo disposição contratual em sentido diverso.
4. No presente caso, conforme consignado pelas instâncias ordinárias, havia, no contrato de seguro viagem firmado entre as partes, cláusula expressa no sentido de que estariam cobertas apenas “as despesas relacionadas à estabilização do quadro clínico do segurado que lhe permita continuar viagem ou retornar ao local de sua residência, não havendo cobertura para a continuidade e o controle de tratamentos anteriores, check-up e extensão de receitas”, além do que “o atendimento de urgência e emergência sob orientação médica deverá ocorrer enquanto o segurado estiver em viagem e respeitando o período de vigência do Bilhete de Seguro”, inexistindo qualquer ilegalidade ou abusividade nas respectivas cláusulas contratuais.
5. Recurso especial desprovido.

Leia o acordão no REsp 1.984.264.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1984264

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