Não houve comprovação de que a medida tenha causado danos.
O carimbo de “cancelado” sobre a anotação de contratação feita na carteira de trabalho não caracteriza, por si só, ato ofensivo à honra do trabalhador e não justifica o deferimento de indenização por danos morais. Com esse entendimento, a Segunda Turma do Tribunal Superior do Trabalho julgou improcedente o pedido de indenização formulado por um operador especializado.
Abuso
O trabalhador foi contratado pela E. J. Prestação de Serviços em Recursos Humanos e Sociedade Ltda. para prestar serviços temporários à Mabe Eletrodomésticos Ltda. em Hortolândia (SP). Segundo narrou na reclamação trabalhista, antes do término do contrato temporário ele havia sido informado de que seria efetivado pela Mabe, que registrou a admissão na carteira de trabalho. No entanto, a empresa voltou atrás e anotou o cancelamento da contratação.
O juízo da Vara do Trabalho de Hortolândia entendeu que houve abuso da empresa porque as anotações prejudicariam a obtenção de novo emprego e deferiu indenização de R$ 8 mil. O Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (Campinas/SP) manteve a sentença, com o fundamento de que a situação causa constrangimentos desnecessários, obrigando o candidato a novo emprego a explicar os motivos da rasura.
Demonstração do dano
No recurso de revista, a Mabe apontou a ausência de provas de ofensa à honra e à intimidade do operador. O relator, ministro José Roberto Freire Pimenta, destacou que o TST vem firmando o entendimento de que a existência de rasura na CTPS decorrente de simples cancelamento do registro não configura, por si só, ato ofensivo à honra.
Após citar diversos precedentes no mesmo sentido, o relator concluiu que o TRT, ao deferir a indenização com base apenas na existência da rasura, contrariou o artigo 186 do Código Civil, pois não houve demonstração de ato danoso à moral do trabalhador.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO ANTERIORMENTE À VIGÊNCIA DA LEI Nº 13.015/2014.
VÍNCULO EMPREGATÍCIO. CONTRATAÇÃO TEMPORÁRIA. ÔNUS DA PROVA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DA VALORAÇÃO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA.
A Corte regional consignou no acórdão recorrido que o reclamante foi contratado pela primeira reclamada para prestar serviços em prol da ora recorrente e que “a prestação de serviços ocorria em atividade essencial à realização do objeto empresarial da tomadora, pois é inegável a importância das atividades desempenhadas pelo autor, contratado como operador especializado” . Constou, ainda, na decisão Regional que, ao contrário do alegado pela reclamada, o “contrato celebrado entre as reclamadas faz tão somente menção genérica aos dois motivos autorizadores da contratação. Ademais, foi celebrado por prazo indeterminado (…), podendo-se concluir, como pontuado pelo d. juízo a quo que as rés mantinham contrato para o fornecimento contínuo de mão-de-obra” . De forma bastante clara, e diametralmente oposta às alegações formuladas pela reclamada em suas razões de recurso de revista, a Corte regional pontificou “que as reclamadas não trouxeram aos autos qualquer prova de que houve o alegado acréscimo extraordinário de serviços a justificar a contratação temporária do demandante para prestar serviços à segunda reclamada” . Dessa forma, afastado o pretenso enquadramento da contratação na hipótese do artigo 2º da Lei n° 6.019/74, correto o entendimento adotado pela Corte regional, no sentido da sua ilegalidade, tendo em vista que o reclamante desempenhava atividade-fim da empresa tomadora de serviços e foi contratado por empresa interposta, enquadrando-se, portanto, na previsão contida no item I da Súmula nº 331 do TST: “I – A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03.01.1974)”. Assim, para se chegar a conclusão diversa, seria necessário o revolvimento da valoração de matéria fático-probatória feita pelas instâncias ordinárias, análise impossível a esta instância recursal de natureza extraordinária, na forma da Súmula nº 126 do TST, não sendo possível constatar a apontada violação dos artigos 3° da CLT e 2° da Lei n°. 6.019/74.
Recurso de revista não conhecido.
HORAS EXTRAS E REFLEXOS. ADICIONAL NOTURNO. INTERVALOS INTRAJORNADA. ÔNUS DA PROVA. NECESSIDADE DE REVOLVIMENTO DA VALORAÇÃO DE MATÉRIA FÁTICO-PROBATÓRIA.
A Corte regional consignou, na decisão recorrida, que, ao contrário do alegado pela reclamada em suas razões recursais, o “reclamante afirmou que anotava corretamente os cartões de ponto (…), apontando diferenças em razões finais ” (grifou-se). Ainda, constou na decisão recorrida que “o r. juízo de origem constatou a existência de horas extras e noturnas não adimplidas, bem como a violação ao intervalo interjornadas” , bem como que “a 2ª reclamada sequer indica onde constam os alegados pagamentos das horas extras, noturnas e do intervalo intrajornada apontados como inadimplidos pelo autor” . Destaca-se, ainda, que a Corte regional foi expressa ao pontuar que o argumento trazido pela reclamada quanto ao dia de fechamento do cartão ponto “sequer foi ventilado na defesa” . Cumpre salientar que somente é importante perquirir a quem cabe o ônus da prova quando não há prova de fato controvertido nos autos, arguido por qualquer das partes. Assim, uma vez que o fato ficou efetivamente provado, conforme asseverou o Tribunal Regional, é irrelevante o questionamento sobre a quem caberia fazer a prova. Portanto, nessa hipótese, não há reconhecer ofensa aos artigos 818 da CLT e 333, inciso I, do CPC de 1973. Por fim, para se chegar a conclusão diversa, seria necessário o revolvimento da valoração de matéria fático-probatória feita pelas instâncias ordinárias, análise impossível a esta esfera recursal de natureza extraordinária, na forma da Súmula nº 126 do TST.
Recurso de revista não conhecido.
INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. RASURA NA CTPS.
A Corte regional manteve a condenação da reclamada no pagamento de indenização por danos morais, com base unicamente na “existência de anotação na carteira de trabalho do reclamante do contrato com a reclamada com o carimbo ‘ CANCELADO’ sobreposta” . Para tanto, a Corte regional entendeu que se configurou hipótese de indenização por danos morais, visto que “todas as vezes que a CTPS do reclamante for apresentada perante um potencial empregador, ou em qualquer outra ocasião, o trabalhador necessitará explicar os motivos da rasura, causando constrangimentos desnecessários e assim caracterizando a lesão moral passível de indenização” . A responsabilidade civil aquiliana, na forma prevista no artigo 186 do Código Civil , depende da demonstração inequívoca do ato danoso, da conduta culposa ou dolosa do agente, bem como do dano propriamente dito. Acerca do tema, esta Corte superior vem firmando entendimento de que a existência de rasura na CTPS, decorrente de simples cancelamento do registro, não configura, por si só, ato ofensivo à honra ou à integridade moral do empregado e, por isso, não dá ensejo ao deferimento de indenização por danos morais. Assim, ao entender devida a indenização por danos morais, fundada apenas na existência de rasura na CTPS do reclamante, a Corte regional proferiu decisão em violação do artigo 186 do Código Civil, visto que não houve a demonstração de ato danoso à moral do autor (precedentes).
Recurso de revista conhecido e provido.
A decisão foi unânime.
Processo: RR-571-12.2010.5.15.0152