Professor com dedicação exclusiva não pode exercer outra atividade, mesmo em horário compatível

Um professor da Universidade Federal da Paraíba (UFPB) não conseguiu suspender o processo administrativo que determinou a devolução dos valores recebidos por ele, a título de dedicação exclusiva, no período em que exerceu cargos em comissão no Governo do Estado de Pernambuco. Por unanimidade, a Quarta Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região – TRF5 manteve a decisão da 2ª Vara da Justiça Federal na Paraíba, que negou o pedido do docente, em tutela de urgência.

Vinculado à UFPB desde 2009, em regime de dedicação exclusiva, o professor foi requisitado e assumiu cargos no Governo de Pernambuco, em 2013 e 2016. Ele alegou ter agido de boa fé, pois, segundo sua versão, os pedidos de cessão teriam sido aprovados pela Universidade. Além disso, nas duas ocasiões em que a instituição de ensino solicitou que fizesse uma escolha entre as atividades que exercia, pediu exoneração dos cargos em comissão. O docente argumentou, ainda, que não houve prejuízos à execução de suas atividades de ensino, pesquisa e extensão.

Para a Quarta Turma do TRF5, não há, no caso, probabilidade de direito que justifique a concessão de tutela de urgência para suspender os descontos na remuneração do professor, destinados a ressarcir o erário pelos valores pagos a título de gratificação por dedicação exclusiva no período em que ele mantinha outro vínculo empregatício. Além disso, não é razoável admitir que o docente ignorava a irregularidade da situação, pois a exclusividade é uma escolha do servidor e, ao fazer essa opção, ele tinha ciência da impossibilidade de exercer outra atividade remunerada.

Em seu voto, o desembargador federal convocado Bruno Carrá, relator do processo, destacou que o professor contratado em regime de dedicação exclusiva deve cumprir uma jornada de 40 horas semanais, dedicando-se integralmente às atividades acadêmicas. A opção por esse regime impede o servidor de exercer simultaneamente outra ocupação profissional, temporária ou não, mesmo que haja compatibilidade de horário.

O recurso ficou assim ementado:

ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. REGIME DE DEDICAÇÃO EXCLUSIVA. EXERCÍCIO DE OUTRA ATIVIDADE. REPOSIÇÃO AO ERÁRIO. CABIMENTO. AGRAVO DE INSTRUMENTO IMPROVIDO.

1.Como ensaiado no relatório, cuida-se de agravo de instrumento interposto por DIMMITRE MORANT VIEIRA GONÇALVES PEREIRA ante decisão proferida pelo MM. Juízo da 2ª Vara da Seção Judiciária da Paraíba que, nos autos de procedimento comum, indeferiu o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, a qual fora formulada no sentido da suspensão do processo administrativo nº 23074.001030/2018-11 de ressarcimento ao erário, bem como da cobrança no valor de R$ 125.685,02, a título de Gratificação por Dedicação Exclusiva, sob pena de multa diária não inferior a R$ 2.000,00.

2.Nas razões de recurso, o agravante alegou o seguinte: (a) a decisão agravada deve ser reformada, uma vez que deixou de observar a ilegalidade do ato administrativo a luz do disposto nos artigos 46 e 133, § 5º, ambos da Lei nº 8.112/90; (b) foi nomeado em 2009 em caráter efetivo para o cargo de professor de 3º grau, Classe Assistente, dedicação exclusiva, do Departamento de Ciências Sociais do Centro de Ciências Aplicadas e Educação da UFPB; (c) em 2013 foi homologada a cessão do agravante, que assumiu cargo em comissão na função de Gerente de Projetos Especiais na Pernambuco Participações e Investimentos S/S- PERPART, no Governo de Pernambuco, e, em agosto de 2014, não houve a renovação da cessão, tendo o autor recebido ofício solicitando a escolha de qual cargo iria ocupar, sua decisão fora apresentar uma carta de próprio punho, em 02/02/2015, requerendo sua exoneração do cargo em comissão na Pernambuco Participações e Investimentos S/A (PERPART); (d) em 2016 o Governo de Pernambuco formalizou pedido de cessão do autor para exercer o cargo de Diretor de Controle dos Gastos das Setoriais da Secretaria de Controladoria Geral do Estado de Pernambuco, tendo o autor recebido notificação da comissão permanente de acumulação de cargos e empregos da UFPB, para escolha entre um dos cargos, ou que o agravante poderia ingressar com pedido, no departamento de lotação, da alteração de regime de trabalho de T-40 com dedicação exclusiva para apenas, regime de 40 horas semanais; (e) em sua defesa apresentada em 27/10/2016, o ora agravante demonstrou a sua boa-fé, tendo em vista que seus pedidos de cessão protocolados pelo Governo de Pernambuco foram deferidos pela ré em todas vezes que fora solicitado, e,  ainda, que o autor agravante sempre cumpriu regularmente os exercícios de suas funções de professor, em que exerceu funções de natureza técnica na PERPART e na Controladoria do Estado de Pernambuco com deferimento dos processos de cessão pelo colegiado do seu departamento de lotação e por sua chefia imediata; (f) em 12/01/ 2018 foi instaurado processo administrativo nº 23074.001030/2018-11, procedimento de reposição ao erário de valores pagos por meio do SIAPE, sob argumento de constatação de acumulação ilícita de cargos públicos/quebra de dedicação exclusiva, em auditoria da Controladoria Geral da União – CGU, apurado nos autos dos processos administrativos 23074.018852/2016-61 e 23074.056961/2016-86, e a Pró Reitoria de Gestão de pessoas requereu o pagamento pelo agravante do valor de R$ 125.685,02 (cento e vinte e cinco mil e seiscentos e oitenta e cinco reais e dois centavos) em que afirma ser o valor total da reposição do erário; (g) o ora agravante apresentou defesa administrativa em 23/04/2018, demonstrando entre outras provas, a boa- fé diante do deferimento dos pedidos de cessão, bem como do exercício das funções acadêmicas em que respeitou a carga horária adequada de sala de aula, pesquisa e extensão, razão pelo qual não houveram prejuízos a execução das atividades de docente com dedicação exclusiva, e, diante do não acolhimento das alegações e da solicitação de que a administração se abstenha de cobrar qualquer valor a título de ressarcimento ao erário em sua defesa administrativa, em 24 de agosto de 2018, o autor apresentou recurso administrativo demonstrando a boa-fé,  tendo em vista que foram abertos dois procedimentos administrativos com pedido de cessão pelo Governo do Estado de Pernambuco para assumir os cargos em comissão tanto na PERPART em 2013 a 2015, quanto na Controladoria do Estado de Pernambuco em 2015 a 2016, ocasião em que foram julgados procedentes por unanimidade. Ante o indeferimento do recurso administrativo apresentando em 2018, o Agravante apresentou um novo recurso administrativo em 18 de fevereiro de 2019; (h) em 26/04/2019, o Conselho Universitário – CONSUNI/UFPB foi favorável a devolução ao erário, concluindo que o agravante deve reparar o dano causado através da reposição aos cofres da União dos valores apurados, e o autor recebeu o ofício nº 08/2021 de 11/01/2021, com uma guia de pagamento no valor de R$ 125.685,02 (cento e vinte e cinco mil, seiscentos e oitenta e cinco reais e dois centavos), cujo contribuinte é o servidor docente DIMMITRE MORANT VIEIRA GONCALVES PEREIRA, lotado no DCSA/CCAE, com vencimento em 26/02/2021; (i) assim, o ora agravante ajuizou Ação de Nulidade de Processo Administrativo de Reposição ao Erário c/c Tutela Antecipada em face UFPB, dentre outros pedidos, requerendo a  suspensão do processo administrativo de nº 23074.001030/2018-11 de ressarcimento ao erário, bem como da cobrança no valor de R$ 125.685,02 (cento e vinte e cinco mil, seiscentos e oitenta e cinco reais e dois centavos), no qual o Juízo a quo indeferiu com alegação de ausência da probabilidade do direito alegado, por falta de pressupostos legais no que tange ao pedido de suspensão do processo administrativo de nº 23074.001030/2018-11. Requer a concessão da tutela de urgência para fins de que seja determinado à agravada que se abstenha de efetivar qualquer tipo de desconto na sua remuneração a título de reposição ao erário de valores decorrentes do pagamento da Gratificação por Dedicação exclusiva, assim como a imediata restituição dos valores já descontados ilegalmente através da expedição de folha de pagamento suplementar ou da inclusão dos mesmos na folha de pagamento subsequente.

3.A teor do art. 300, NCPC, a tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo.

4.No caso dos autos, não restou constatada a probabilidade do direito com relação a suspensão do desconto na remuneração da servidora agravante a título de reposição ao erário de valores decorrentes do pagamento da Gratificação por Dedicação exclusiva, referentes ao período em que mantinha outro vínculo empregatício, em violação ao citado regime. Considerando que a opção pelo regime de dedicação exclusiva impede o servidor de exercer simultaneamente outra atividade, temporária ou não, mesmo que haja compatibilidade de horário, de modo que não se aplica aos servidores submetidos a tal regime a acumulação prevista no art. 37, inciso XVI, da Constituição Federal. A exigência de dedicação exclusiva, como o próprio sugere, inviabiliza a acumulação. O que se discute, portanto, é o descumprimento de obrigação prevista em lei.

5. O Decreto nº 94.664/87, que regula o Plano Único de Classificação e Retribuição de Cargos e Empregos das Universidades e demais instituições federais de ensino superior, no art. 31, §5º, determina que o professor com dedicação exclusiva perceberá um acréscimo de 50% (cinquenta por cento) sobre o vencimento básico correspondente ao regime de 40 horas semanais de trabalho. Portanto, o servidor contratado com dedicação exclusiva obriga-se ao cumprimento de uma jornada de quarenta horas semanais, devendo se dedicar integralmente às atividades acadêmicas, sendo-lhe vedado, enquanto estiver sob esse regime especial, o exercício de outra atividade remunerada, pública ou privada.

9. No caso, não se mostra razoável admitir que o agravante ignorava a irregularidade em que se encontrava. O próprio nome do regime pelo qual optou, com percepção de vantagem financeira pela exclusividade, não deixa dúvida a respeito da vedação de exercício concomitante com outra atividade profissional. Tratando-se o regime de dedicação exclusiva de opção do servidor, que deve ser manifestada perante a Administração Pública, afasta-se eventual alegação de boa-fé para fins de obstar a restituição ao erário da gratificação referente à exclusividade, dado que ao fazer tal opção o servidor tem ciência da impossibilidade de exercer outra atividade remunerada.

10.Sobre a matéria, esta Corte Regional vem entendendo ser possível a restituição ao erário de valores referentes à gratificação de dedicação exclusiva percebidas de forma indevida por servidor, que não respeitou a proibição de cumulação de cargos, em razão da impossibilidade de se presumir a sua boa-fé, visto que o próprio servidor fez opção pelo regime de exclusividade. Precedente: 0812669-59.2019.4.05.8100 – APELAÇÃO CÍVEL – AC/CE – RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Edilson Pereira Nobre Junior – 4ª Turma – JULGAMENTO: 26/01/2020.

11.Agravo de instrumento do servidor improvido.

Processo nº 0806801-82.2021.4.05.0000

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