Não há prova de que os portuários com vínculo, do mesmo local, recebiam a parcela
A Quinta Turma do Tribunal Superior do Trabalho excluiu da condenação imposta à Top Service Serviços e Sistemas S.A., com sede em Lauro de Freitas (BA), o pagamento de adicional de risco a um trabalhador portuário avulso do Porto de Tubarão (ES). O colegiado não aplicou o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) de que o avulso tem direito à parcela quando o portuário com vínculo permanente também a recebe porque, no caso específico, não havia registro dessa circunstância.
Limpeza industrial
Na Justiça do Trabalho, o portuário disse que fora admitido pela Top Service em julho de 2019, como auxiliar de serviços gerais, e dispensado em janeiro de 2020. Segundo ele, a empresa prestava serviços no terminal da Vale S.A. no Porto de Tubarão, e a área em que atuava não era privativa, mas mista.
Ele sustentou que ficava exposto a agentes de risco ao realizar a limpeza industrial em píeres e porões de navios, após o descarregamento de mercadorias. Devido a essas condições, requereu o recebimento do adicional de risco portuário, previsto no artigo 14 da Lei 4.860/1965 para trabalhadores que prestam serviços em área de porto.
Área mista
O Tribunal Regional do Trabalho da 17ª Região (ES) manteve a sentença pela qual fora determinado o pagamento da parcela, levando em conta o laudo pericial que confirmara a exposição a riscos. Ainda de acordo com o TRT, o adicional só não seria devido aos trabalhadores de portos privativos, diferentemente da situação analisada, em que a área era mista.
Porto privativo
No recurso de revista, a Top Service argumentou que o auxiliar atuava nas instalações da Vale, empresa privada que opera seus serviços no Porto de Tubarão. Portanto, não se trata de porto organizado como definido na Lei.
STF
O relator do recurso, ministro Douglas Alencar, destacou que o TST tinha o entendimento de que o artigo 14 da Lei 4.860/1965 não garante a extensão do adicional aos avulsos, mas somente aos portuários empregados na administração do porto (Orientação Jurisprudencial 402 da Subseção 1 Especializada em Dissídios Individuais do Tribunal).
Contudo, o STF, em julgamento com repercussão geral (Tema 222), fixou a tese de que os portuários avulsos têm os mesmos direitos dos que têm vínculo permanente, porque a Constituição Federal estabelece a igualdade de direitos. Desse modo, sempre que o adicional de risco for pago ao trabalhador com vínculo permanente, será devido, também, ao avulso.
Ocorre que, segundo o relator, o Tribunal Regional registrara apenas que o trabalhador prestava serviços em terminal portuário misto, sem informar se a parcela era paga aos portuários com vínculo no mesmo local. Como esse aspecto factual não pode ser verificado pelo TST, pois a Súmula 126 veda o reexame das provas do processo nessa fase recursal, o colegiado afastou a condenação.
O recurso ficou assim ementado:
I. AGRAVO. RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELAS LEIS 13.015/2014 e 13.467/2017. ADICIONAL DE RISCO DO TRABALHADOR PORTUÁRIO COM VÍNCULO PERMANENTE. POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO AOS TRABALHADORES PORTUÁRIOS AVULSOS. TESE DE REPERCUSSÃO GERAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. TEMA 222. Verificado equívoco na decisão quanto ao exame das premissas constantes do acórdão regional, impõe-se a reforma da decisão agravada. Agravo provido.
II. RECURSO DE REVISTA. REGIDO PELAS LEIS 13.015/2014 E 13.467/2017. ADICIONAL DE RISCO DO TRABALHADOR PORTUÁRIO COM VÍNCULO PERMANENTE. POSSIBILIDADE DE EXTENSÃO AOS TRABALHADORES PORTUÁRIOS AVULSOS. TESE DE REPERCUSSÃO GERAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. TEMA 222. TRANSCENDÊNCIA POLÍTICA CARACTERIZADA. Caso em que o Tribunal Regional manteve a sentença, na qual determinado o pagamento do adicional de risco portuário ao Reclamante, sob o fundamento de que desenvolveu suas atividades, sujeito a riscos, em terminal portuário misto. Prevalece neste Tribunal Superior do Trabalho o entendimento de que o disposto no art. 14 da Lei 4.860/65 não garante a extensão do adicional de risco aos trabalhadores avulsos, mas somente aos portuários com vínculo de emprego com a administração do porto. O Supremo Tribunal Federal, por ocasião do julgamento do RE 597124/PR (Tema 222), em sede de repercussão geral, firmou novo entendimento no sentido de que “o fato de os trabalhadores portuários avulsos sujeitarem-se a um regime de exploração diferenciado daqueles trabalhadores portuários com vínculo permanente não autoriza tratamento diferenciado entre eles, pois há norma constitucional explícita e específica de igualdade de direitos, de modo que, uma vez implementadas as condições legais específicas, ao trabalhador portuário avulso também é devido o adicional de riscos, previsto no art. 14 da Lei 4.860/1965, por imposição constitucional expressa”. No presente caso, contudo, não há como aplicar o entendimento do STF, porquanto o Tribunal Regional limitou-se a assinalar que o Reclamante prestava serviços em terminal portuário misto, sem consignar se havia, de fato, o pagamento do adicional de risco aos trabalhadores portuários com vínculo permanente, premissa fática necessária para se aplicar a decisão do STF. Incidência da Súmula 126/TST ao conhecimento do recurso de revista. Acórdão regional contrário ao entendimento consagrado pelo STF e à jurisprudência desta Corte, restando configurada a transcendência política do debate. Recurso de revista conhecido e provido.
A decisão foi unânime.
Processo: Ag-RR-600-12.2020.5.17.0005