Laudo de perito investigado por fraude em operação policial é válido

Sem condenação penal, deve prevalecer a presunção de inocência do profissional.

A Subseção II Especializada em Dissídios Individuais (SDI-2) do Tribunal Superior do Trabalho negou o pedido de um operador de fabricação de Campinas (SP) para anular a decisão final de uma ação trabalhista movida contra a Robert Bosch Ltda., com o argumento de que o perito que atuara no processo está sendo investigado por fraudar laudos. Para o colegiado, diante do princípio constitucional da presunção de inocência, o fato de o perito estar entre os investigados não comprova a sua conduta desonesta.

Ausência de doença profissional

Na ação, o operador de fabricação requereu garantia de emprego até a aposentadoria, além de indenização por danos materiais e morais, em decorrência de doença ocupacional (tendinopatia nos ombros) supostamente adquirida em razão das atividades desempenhadas para a empregadora por mais de oito anos. Contudo, o laudo pericial concluiu que não havia relação entre a doença e o serviço executado. De acordo com o perito, a doença era de natureza degenerativa, pois as tarefas não eram repetitivas, o posto de trabalho não apresentava risco ergonômico nem havia uso de força muscular suficiente para causar as lesões.

A partir das conclusões desse laudo, a 9ª Vara do Trabalho de Campinas (SP) e o Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região julgaram improcedentes os pedidos do empregado, e os recursos encaminhados ao TST, na sequência, também foram rejeitados.

Operação Hipócritas

Ocorre que, em 2016, o Ministério Público Federal e a Polícia Federal deflagaram a “Operação Hipócritas”, para apurar a prática de corrupção e fraudes cometidas por peritos médicos em processos trabalhistas, com o objetivo de beneficiar empresas. Como o perito que havia elaborado o laudo no seu processo estava entre os investigados, o trabalhador ingressou com a ação rescisória para anular a sentença, com o argumento de que ela tinha sido baseada em prova pericial fraudulenta.

Ausência de condenação

Ao decidir pela improcedência da ação rescisória, o TRT destacou que o empregado apenas reunira notícias da internet e que não havia condenação em relação ao perito nem fora apresentado documento que pudesse invalidar o laudo.

Presunção de inocência

O relator do recurso do operador na SDI-2, ministro Evandro Valadão, assinalou que o fato de o perito estar entre os nomes investigados na operação policial não comprova a sua conduta desonesta, conforme o princípio constitucional da presunção de inocência (artigo 5º, inciso LVIII, da Constituição Federal).

Ainda segundo o ministro, o próprio trabalhador reconhece que não houve condenação penal do perito, e não há provas de que o laudo produzido no processo seja falso. Nessas condições, ele rejeitou o apelo.

A decisão da SDI-2 foi por maioria de votos, com divergência da ministra Maria Helena Mallmann. Para a ministra, a ação rescisória não preenche os requisitos processuais para o seu processamento.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ORDINÁRIO EM AÇÃO RESCISÓRIA. TRÂNSITO EM JULGADO OPERADO NA VIGÊNCIA DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973. 1. PRETENSÃO RESCISÓRIA CALCADA EM PROVA FALSA. LAUDO PERICIAL FALSO. PERITO INVESTIGADO NA \”OPERAÇÃO HIPÓCRITAS\”. AUSÊNCIA DE CONDENAÇÃO DO PERITO. NÃO PROVIMENTO.

I. A sentença de mérito, transitada em julgado, pode ser rescindida quando se fundar em prova, cuja falsidade tenha sido apurada em processo criminal ou seja provada na própria ação rescisória.

II. No caso concreto, a parte ajuizou ação rescisória alegando falsidade do laudo pericial em que se fundou a sentença apenas com a notícia de que o d. perito estava sendo investigado na operação da Polícia Federal \”Hipócritas\”, sendo que não há nos autos qualquer informação de condenação penal ou prova específica de falsificação do laudo produzido na ação matriz.

III. Nesse contexto, não havendo prova da falsidade do laudo pericial na notícia apresentada pela parte recorrente, e nem comprovação nestes próprios autos, não prospera a rescisão almejada pela parte.

IV. Recurso ordinário de que se conhece e a que se nega provimento.

2. DOCUMENTO NOVO. LAUDO PERICIAL ELABORADO EM AÇÃO CÍVEL. IMPOSSIBILIDADE DE UTILIZAÇÃO AO TEMPO DO PROCESSO. NÃO COMPROVAÇÃO. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 402 DO TST.

I. Dispunha a Súmula 402 do TST, ao tempo do trâmite da ação matriz, que o documento novo, capaz de rescindir a decisão transitada em julgado, é o cronologicamente velho, já existente ao tempo da decisão rescindenda, mas ignorado pelo interessado ou de impossível utilização, à época, no processo.

II. No caso concreto, a parte alega que somente teve acesso ao laudo pericial produzido em ação cível, trazido como documento novo e supostamente conflitante com as provas dos autos, na data de 30/10/2012.

III. No entanto, a sentença de primeiro grau foi prolatada em 22/04/2013 e o acórdão rescindendo em 10/10/2014, tendo se operado o trânsito em julgado da reclamação trabalhista apenas em 05/10/2015.

IV . Não bastasse isso, em detida análise da ação matriz, verifica-se que o laudo pericial, aqui trazido como \”prova nova\”, foi, efetivamente, apresentado e citado quando do julgamento de seu recurso ordinário na ação trabalhista, não tendo modificado, todavia, a conclusão jurídica do juízo originário.

V. Assim, incabível a rescisão pleiteada com base em documento novo quando este já estava em posse da parte ao tempo do trâmite da ação matriz.

VI. Recurso ordinário de que se conhece e a que se nega provimento.

3. PRINCÍPIO DE VEDAÇÃO DA DECISÃO SURPRESA. AUSÊNCIA DE VIOLAÇÃO. CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 219, II e IV, DO TST.

I. Nos termos da Súmula 219, II e IV, do TST, é cabível a condenação ao pagamento de honorários advocatícios em ação rescisória no processo trabalhista. Ademais, a responsabilidade pelo pagamento dos honorários advocatícios da sucumbência submete-se à disciplina dos arts. 85, 86, 87 e 90 do Código de Processo Civil de 2015.

II. No caso concreto, o Tribunal Regional condenou a parte recorrente ao pagamento de honorários advocatícios de 10% sobre o valor da causa com base no Código de Processo Civil de 2015 e na Súmula 219 desta Corte Superior.

III. Contudo, inadvertidamente, a recorrente, ao impugnar a condenação em honorários sucumbenciais, o faz sob a alegação de que o Tribunal Regional não poderia ter aplicado a Lei nº 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) a este processo, porquanto a ação teria sido ajuizada em data anteriormente à vigência da referida lei.

IV. Nesse sentido, não é possível a reforma do acórdão regional, devendo ser mantido incólume, nos termos em que proferido.

V. Recurso ordinário de que se conhece e a que se nega provimento.

Processo: RO-7668-87.2017.5.15.0000

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