O servidor do Ministério das Comunicações ficou cedido à ECT de 2004 a 2011.
A Terceira Turma do Tribunal Superior do Trabalho reconheceu a competência da Justiça do Trabalho para julgar o pedido de liberação do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) de um servidor público estatutário relativo ao período em que fora cedido à Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos (ECT). Para o colegiado, a pretensão está vinculada à relação entre ele e a empresa que se submete ao regime celetista.
FGTS
O servidor público do Ministério das Comunicações foi cedido aos Correios de 2004 a 2011 e, após o fim da cessão, tentou sacar os valores depositados em sua conta do FGTS no período, mas o pedido foi negado pela Caixa Econômica Federal, gestora do fundo. Ele, então, ajuizou a reclamação trabalhista visando à expedição de alvará judicial com essa finalidade.
Estatutário
O juízo da 11ª Vara do Trabalho de Brasília (DF) entendeu que não competia à Justiça do Trabalho julgar processo que envolve servidor público, e a decisão foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 10ª Região. Para as instâncias de origem, a circunstância de o servidor ter sido cedido à empresa pública não desnatura a relação jurídico-administrativa originária (de servidor estatutário), pois não surgiria, durante a cessão, uma nova relação jurídica empregatícia.
Origem celetista do pedido
O relator do recurso do servidor, ministro Mauricio Godinho Delgado, lembrou o entendimento do Supremo Tribunal Federal (STF) de que a Justiça do Trabalho não tem competência para julgar causas entre o poder público de servidor estatutário. Contudo, no caso, o que está em discussão não é a existência de vício nessa relação estatutária, mas aspectos relativos à cessão, realizada com ônus para a ECT. “Embora a cessão não altere a natureza do vínculo administrativo, o pedido tem origem no vínculo celetista entre o cedido e empresa cessionária, circunstância que atrai a competência material da Justiça do Trabalho”, afirmou.
Ainda de acordo com o ministro, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) já declarou a competência da Justiça do Trabalho em casos envolvendo parcelas de natureza trabalhistas pagas a servidor público estatutário pela empresa cessionária no decurso da cessão. “Pela Constituição da República, é da Justiça do Trabalho a competência para conhecer e julgar lides sobre relações de trabalho, ainda que não se trate especificamente de vínculo empregatício, mas envolvendo, na relação de trabalho lato sensu, parcela tipicamente trabalhista”, concluiu.
Por unanimidade, a Turma acolheu o recurso e determinou o retorno dos autos à Vara do Trabalho de origem, a fim de que prossiga o julgamento da ação.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/17 . COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. SERVIDOR ESTATUTÁRIO CEDIDO A EMPRESA PÚBLICA (PERÍODO DE 03.12.2004 A 18.10.2011). SAQUES DE FGTS DEPOSITADOS PELA CESSIONÁRIA EM CONTA VINCULADA EM NOME DO RECLAMANTE. ART. 114, I, DA CRFB. Demonstrado no agravo de instrumento que o recurso de revista preenchia os requisitos do art. 896 da CLT, dá-se provimento ao agravo de instrumento, para melhor análise da arguição de violação do art. 114, I, da CF, suscitada no recurso de revista. Agravo de instrumento provido.
RECURSO DE REVISTA. PROCESSO SOB A ÉGIDE DA LEI 13.015/2014 E ANTERIOR À LEI 13.467/17 . COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO. SERVIDOR PÚBLICO ESTATUTÁRIO CEDIDO A EMPRESA PÚBLICA (PERÍODO DE 03.12.2004 A 18.10.2011). A EMPRESA PÚBLICA CESSIONÁRIA, VOLUNTARIAMENTE, REALIZA, NA CONTA VINCULADA DO TRABALHADOR QUE LHE PRESTA SERVIÇOS, DEPÓSITOS MENSAIS DE FGTS, CALCULADOS SOBRE AS VERBAS SALARIAIS ORIGINÁRIAS DO SERVIDOR. SUBSEQUENTE LITÍGIO SOBRE SAQUES DO FGTS DEPOSITADOS PELA CESSIONÁRIA NA CONTA VINCULADA EM NOME DO RECLAMANTE. LIDE SURGIDA ENTRE A CEF, EMPRESA CESSIONÁRIA, E O SERVIDOR A ELA CEDIDO, VERSANDO SOBRE DIREITO TRABALHISTA (FGTS). ART. 114, I, DA CRFB. COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA DO TRABALHO PARA EXAMINAR ESTA LIDE ESPECÍFICA, SEM AFETAÇÃO À RELAÇÃO JURÍDICA ESTATUTÁRIA COM O ÓRGÃO DE ORIGEM. Cinge-se a controvérsia acerca da competência desta Justiça Especializada para processar e julgar pedido de servidor público federal para levantamento dos valores depositados na conta vinculada do fundo de garantia, no período de 03/12/2004 a 18/10/2011, quando se encontrava cedido para a Empresa Brasileira de Correios e Telégrafos. O Pleno do STF referendou liminar concedida pelo Ministro Nelson Jobim no julgamento da Medida Cautelar na ADI 3.395-6/DF, no sentido de que, mesmo após a EC nº 45/2004, a Justiça do Trabalho não tem Competência para processar e julgar causas instauradas entre o Poder Público e o servidor que a ele seja vinculado por relação jurídico-administrativa. No mesmo sentido, o Supremo Tribunal Federal tem reconhecido a competência da Justiça Comum para pronunciar-se sobre a existência, a validade e a eficácia das relações entre servidores e o Poder Público fundadas em vínculo jurídico-administrativo, registrando ser irrelevante a argumentação de que o contrato é temporário ou precário, ou que tenha sido extrapolado seu prazo inicial. (Rcl 11325 AgR/CE – CEARÁ, AG.REG. NA RECLAMAÇÃO, Relator(a) p/ Acórdão: Min. DIAS TOFFOLI, Julgamento: 06/05/2014. Órgão Julgador: Primeira Turma). Ocorre, contudo , que não se discute na presente hipótese a existência de vício na relação jurídico-administrativa de modo a descaracterizá-la. Como visto, o Reclamante pretende a liberação de depósitos do FGTS recolhidos pela empresa jurídica cessionária, durante o período da cessão. Impõe-se, ainda, ressaltar que, conforme se extraem das premissas fáticas constantes do voto vencido, e não contrapostas pelo voto vencedor, a cessão do Reclamante – servidor público estatutário – para a ECT foi realizada com ônus para a cessionária. Com efeito, inobstante ser o Reclamante servidor público integrante dos quadros do Ministério das Comunicações, e, sendo certo, que a cessão do servidor não transmuda o vínculo administrativo, consoante destacado pelo acórdão regional, a pretensão deduzida tem origem no liame havido entre o Reclamante e empresa cessionária que se submete ao regime celetista, circunstância que atrai a competência material da Justiça do Trabalho, nos termos do art. 114, I da CF. Nessa diretriz, o Superior Tribunal de Justiça, examinando, em sede de Conflito de Competência, casos envolvendo discussão acerca de parcelas de natureza trabalhista pagas a servidor público estatutário pela empresa cessionária no decurso da cessão, declarou a competência desta Justiça Especializada para o processamento do feito. Realmente, pela Constituição da República, é da Justiça do Trabalho a competência para conhecer e julgar lides sobre relações de trabalho, ainda que não se trate especificamente de vínculo empregatício, mas envolvendo, na relação de trabalho lato sensu , parcela tipicamente trabalhista. Logo, a declaração de incompetência da Justiça do Trabalho para julgar a presente lide afronta o art. 114, I, da CF. Recurso de revista conhecido e provido .
Processo: RR-1044-27.2017.5.10.0011