Exige-se juízo de certeza para condenação pelo crime de estelionato por compensação de cheque nominativo fraudado

Ainda que seja improvável o êxito da fraude sem participação de algum empregado da Caixa Econômica Federal (Caixa) e apesar de o valor do cheque nominativo ter sido compensado na conta de titularidade do acusado, não há nada nos autos que o vincule à posição de beneficiário, decidiu a 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) ao reformar a sentença e absolver o acusado pela prática do crime de estelionato.

Fundamentou-se a sentença que condenou o acusado no fato de o cheque, nominativo, ter sido depositado na conta de que ele era titular e os saques terem sido feitos com cartão de crédito com senha pessoal, na região em que reside o acusado.

Ao analisar o processo, o relator, juiz federal convocado Saulo Casali Bahia, verificou que não haver evidência de que o acusado foi beneficiário do valor a ser pago por meio do cheque. Frisou que nada há nos autos a apontar com segurança que foi o acusado o responsável pelos saques em sua conta, já que não há perícia grafotécnica, prova testemunhal, confissão ou qualquer outra modalidade probatória nesse sentido.

Completou o magistrado que o acusado poderia, inclusive, ter sido também vítima da manobra fraudulenta sem percebê-la por se tratar de conta inativa, sem movimentação financeira.

Feitas essas considerações, completou o relator, a respeito da autoria do crime há apenas indícios (provas leves) e deduções que não se sustentam com firmeza, o que impõe o provimento da apelação dada a insuficiência da prova para a condenação, nos termos do art. 386, V, do Código de Processo Penal (CPP).

O recurso ficou assim ementado:

PENAL. PROCESSUAL PENAL. ART. 171, §3º, DO CÓDIGO PENAL. ESTELIONATO. CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. DEPÓSITO E COMPENSAÇÃO DE CHEQUE NOMINAL FRAUDADO.  SAQUE MEDIANTE USO DE CARTÃO DE CRÉDITO COM SENHA PESSOAL E INTRANSFERÍVEL. AUTORIA NÃO DEMONSTRADA. EXIGÊNCIA DE JUÍZO DE CERTEZA PARA CONDENAÇÃO. SENTENÇA REFORMADA. ABSOLVIÇÃO.

  1. No caso, pelas peculiaridades apresentadas, embora não se tenha dúvida acerca da materialidade delitiva, a respeito da autoria, bem como do elemento subjetivo do acusado, há apenas indícios (provas leves) e deduções que não se sustentam com firmeza, o que impõe o provimento da apelação, dada a insuficiência da prova para a condenação.

  2. Nessa modalidade de título de crédito, em que há indicação do beneficiário dos valores a serem compensados no próprio cheque (cheque nominal), a compensação deve ser feita apenas por ele (beneficiário), mediante comparecimento ao guichê de atendimento do caixa da agência sacada, ou, no caso de ter sido realizado endosso – que é, basicamente, a aposição de um novo destinatário para os valores na própria cártula – pelo endossatário.

  3. No caso, a despeito do valor do cheque ter sido compensado na conta de titularidade do acusado, não há nada nos autos que o vincule à posição de beneficiário (que, no caso, era a empresa “Magazine Luiza”), tampouco à posição de endossatário, do valor a ser pago por meio do cheque. Desse modo, improvável o êxito da fraude sem alguma leniência de qualquer dos prepostos da empresa sacada; tal fato, contudo, não foi minimamente ventilado na denúncia, tampouco na sentença.

  4. Nada há nos autos, além dos indícios vislumbrados pelo magistrado, a apontar com segurança que a cártula foi fraudada pelo acusado, já que não há perícia grafotécnica, prova testemunhal, confissão ou qualquer outra modalidade probatória nesse sentido. Ainda, nada há nos autos, além dos indícios vislumbrados pelo magistrado, a apontar com segurança que foi o acusado o responsável pelos saques em sua conta, podendo ele, inclusive, ter sido também vítima da manobra fraudulenta, sem percebê-la por se tratar de conta inativa.

  5. Apelação provida para absolver o acusado pela prática do crime previsto no art. 171, §3º, do Código Penal, nos termos do art. 386, V, do CPP.

Processo: 0007965-42.2016.4.01.3803

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