Declaração de insolvência não elimina capacidade processual do devedor

A declaração de insolvência não retira do devedor a capacidade de estar em juízo. Com esse entendimento, a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reformou acórdão do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) e reconheceu a legitimidade recursal de um devedor insolvente para arguir a suspeição do credor indicado como administrador da massa falida.

No caso julgado, o TJMG entendeu que a declaração de insolvência do devedor implica a perda de sua capacidade processual, não podendo ser parte para contestar a indicação do administrador da massa falida. Contrariado com a nomeação do “inimigo” e maior dos seus credores como administrador dos seus bens, o devedor insolvente impugnou a decisão.

O pedido foi indeferido pelo juízo de primeiro grau. O tribunal mineiro não conheceu do recurso do devedor, entendendo que lhe faltava capacidade processual.

Para o relator do recurso no STJ, ministro Paulo de Tarso Sanseverino, não constitui efeito material ou processual da declaração de insolvência a perda da capacidade processual do devedor insolvente, podendo ele comparecer em juízo para defender seus interesses relacionados ao próprio reconhecimento da insolvência.

Equívoco

Segundo o ministro, o equívoco do acórdão recorrido foi conferir interpretação extensiva a disposições processuais combinando a regra do artigo 766 com as dos artigos 7º e 12 do Código de Processo Civil para extrair um novo efeito que limita a capacidade processual do devedor insolvente.

No entendimento do relator, o tribunal de origem confundiu a inaptidão econômica do devedor em solver suas dívidas (artigo 750) com a incapacidade de declarar sua vontade para o exercício de seus direitos (artigo 7º). Segundo ele, “não é possível a utilização do método da interpretação extensiva para a restrição de direitos civis”.

Ao contrário, sustentou o relator, as dificuldades econômicas do devedor insolvente não lhe retiram a capacidade processual de defender seus interesses, pois continua sendo uma pessoa física no exercício dos direitos civis, embora com algumas restrições relativas ao patrimônio arrecadado para garantir a execução coletiva.

Ao votar pelo provimento do recurso especial, Sanseverino concluiu que, por motivos óbvios, o devedor insolvente perde apenas o direito de administrar e de dispor de seu patrimônio, mas não se extrai da regra geral do artigo 7º, combinada com o artigo 12, a perda de sua capacidade processual.

Por unanimidade, a Turma determinou o retorno dos autos à origem para prosseguir no julgamento do mérito do recurso.

O recurso ficou assim ementado:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL CIVIL. INSOLVÊNCIA CIVIL. CAPACIDADE PROCESSUAL E LEGITIMIDADE RECURSAL DO DEVEDOR INSOLVENTE. ARGUIÇÃO DE SUSPEIÇÃO DO CREDOR INDICADO PARA ADMINISTRADOR DA MASSA INSOLVENTE.
1. Reconhecimento da legitimidade recursal do devedor insolvente para veicular sua irresignação contra o credor indicado para administrador da massa insolvente, arguindo a sua suspeição.
2. Não constitui efeito da declaração de insolvência a perda da capacidade processual do devedor insolvente, tendo, inclusive o direito de recorrer.
3. Impossibilidade de utilização de interpretação extensiva de regras processuais para limitação de direitos.
4. Precedente análogo da Terceira Turma do STJ em caso de interdição (REsp 1.251.728⁄PE, minha relatoria, julgado em 14⁄05⁄2013).
5. RECURSO ESPECIAL PROVIDO.

Leia a íntegra do voto do relator.

Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): REsp 1315421

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