Homem trabalhou no cultivo de café no Paraná e como segurança de uma empresa em São Paulo
A Sétima Turma do Tribunal Regional Federal da 3ª Região (TRF3), por unanimidade, determinou ao Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) converter em tempo comum os 9,5 anos de atividade especial exercida por um homem no cultivo de café, em Ribeirão do Pinhal/PR, e no serviço de vigilância armada, em São Paulo/SP, e confirmou a concessão de aposentadoria proporcional por tempo de contribuição.
Para o colegiado, laudos técnicos e provas nos autos demonstraram que o autor faz jus ao benefício. Ele trabalhou em ambiente sujeito a periculosidade e a ruídos superiores aos limites legais. O reconhecimento do tempo de atividade especial, somado ao tempo comum do trabalhador, foi suficiente para aquisição proporcional da aposentadoria.
Documentos e depoimentos de testemunhas comprovaram que o autor, entre 1970 e 1975, trabalhou em uma fazenda em Ribeirão do Pinhal, na cultura do café. Posteriormente, mudou-se para São Paulo para laborar em outras profissões, entre elas, a de vigia.
Segundo o desembargador federal Carlos Delgado, relator do acórdão no TRF3, “a prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino no período”.
Atividade de vigilância
Para o relator, o trabalhador também fez jus ao reconhecimento do período de atividade especial que atuou como vigia, com uso e porte de arma, entre 1987 e 1991, protegendo o patrimônio de uma indústria de tecelagem. “A profissão de guarda patrimonial, vigia, vigilante e afins é considerada de natureza especial durante todo o período a que está a integridade física do trabalhador, sujeita aos riscos de seu dever de proteger o bem alheio”, ressaltou.
O magistrado destacou que a reforma legislativa realizada pela Lei nº 12.740/2012, que alterou o artigo 193 da Consolidação das Leis do Trabalho, considerou a atividade de vigilante como perigosa, com aplicação de adicional de 30%, em virtude da exposição da categoria a roubos ou outras espécies de violência.
Para o relator, com a soma dos períodos enquadrados e devidamente convertidos, a parte autora possui 34 anos, três meses e 16 dias de serviço, tempo suficiente para a aquisição da aposentadoria proporcional por tempo de contribuição.
Por fim, a Nona Turma manteve a sentença que determinou ao INSS pagar o benefício a partir da data do requerimento administrativo, em 23 de março de 2012, conforme entendimento sedimentado nos tribunais superiores e no TRF3.
O recurso ficou assim ementado:
PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. INÍCIO DE PROVA DOCUMENTAL. PROVA TESTEMUNHAL IDÔNEA. RECONHECIMENTO. ATIVIDADE ESPECIAL. ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL. VIGIA. RECONHECIMENTO. TEMPO SUFICIENTE. BENEFÍCIO PROPORCIONAL CONCEDIDO. CORREÇÃO MONETÁRIA. JUROS DE MORA. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. APELAÇÃO DO INSS PARCIALMENTE PROVIDA.
1 – Em que pese não ser possível aferir, de plano, o valor exato da condenação, levando em conta o termo inicial do benefício (25/08/2016) e a data da prolação da r. sentença (23/03/2012), ainda que a renda mensal inicial do benefício seja fixada no teto da Previdência Social, mesmo assim, o valor total da condenação, incluindo correção monetária, juros de mora e verba honorária, será inferior a 1.000 (mil) salários-mínimos, conforme previsto no inciso I do §3º do artigo 496 do Código de Processo Civil.
2 – O art. 55, §3º, da Lei de Benefícios estabelece que a comprovação do tempo de serviço somente produzirá efeito quando baseada em início de prova material, não sendo admitida prova exclusivamente testemunhal. Súmula nº 149, do C. Superior Tribunal de Justiça.
3 – A exigência de documentos comprobatórios do labor rural para todos os anos do período que se pretende reconhecer é descabida. Sendo assim, a prova documental deve ser corroborada por prova testemunhal idônea, com potencial para estender a aplicabilidade daquela. Precedentes da 7ª Turma desta Corte e do C. Superior Tribunal de Justiça. Tais documentos devem ser contemporâneos ao período que se quer ver comprovado, no sentido de que tenham sido produzidos de forma espontânea, no passado.
4 – O C. Superior Tribunal de Justiça, por ocasião do julgamento do RESP nº 1.348.633/SP, adotando a sistemática do artigo 543-C do Código de Processo Civil, assentou o entendimento de que é possível o reconhecimento de tempo de serviço rural exercido em momento anterior àquele retratado no documento mais antigo juntado aos autos como início de prova material, desde que tal período esteja evidenciado por prova testemunhal idônea.
5 – É pacifico o entendimento no sentido de ser dispensável o recolhimento das contribuições para fins de obtenção de benefício previdenciário, desde que a atividade rural tenha se desenvolvido antes da vigência da Lei nº 8.213/91.
6 – Pretende a parte autora o reconhecimento do trabalho rural no intervalo de 01/01/1970 a 31/12/1975.
7 – Como pretenso início de prova material, o requerente juntou: a) Certificado de dispensa de incorporação, datado de 15/06/1971, em que o autor é identificado como “lavrador” (ID 96860366 – Pág. 86); b) Certidão de casamento do requerente, em 25/11/1972, na qual consta que este exercia à época a profissão de “lavrador” (ID 96860366 – Pág. 87); c) Certidão de nascimento do filho do demandante, em 29/04/1974, em que o postulante é qualificado como “lavrador” (ID 96860366 – Pág. 88). A documentação juntada é suficiente à configuração do exigido início de prova material.
8 – A prova oral reforça o labor no campo, e amplia a eficácia probatória dos documentos carreados aos autos, sendo possível reconhecer o trabalho campesino no período de 01/01/1970 a 31/12/1975.
9 – Com relação ao reconhecimento da atividade exercida como especial e em obediência ao aforismo tempus regit actum, uma vez prestado o serviço sob a égide de legislação que o ampara, o segurado adquire o direito à contagem como tal, bem como à comprovação das condições de trabalho na forma então exigida, não se aplicando retroativamente lei nova que venha a estabelecer restrições à admissão do tempo de serviço especial.
10 – Em período anterior à da edição da Lei nº 9.032/95, a aposentadoria especial e a conversão do tempo trabalhado em atividades especiais eram concedidas em virtude da categoria profissional, conforme a classificação inserta no Anexo do Decreto nº 53.831, de 25 de março de 1964, e nos Anexos I e II do Decreto nº 83.080, de 24 de janeiro de 1979, ratificados pelo art. 292 do Decreto nº 611, de 21 de julho de 1992, o qual regulamentou, inicialmente, a Lei de Benefícios, preconizando a desnecessidade de laudo técnico da efetiva exposição aos agentes agressivos, exceto para ruído e calor.
11 – A Lei nº 9.032, de 29 de abril de 1995, deu nova redação ao art. 57 da Lei de Benefícios, alterando substancialmente o seu §4º, passando a exigir a demonstração da efetiva exposição do segurado aos agentes nocivos, químicos, físicos e biológicos, de forma habitual e permanente, sendo suficiente a apresentação de formulário-padrão fornecido pela empresa. A partir de então, retirou-se do ordenamento jurídico a possibilidade do mero enquadramento da atividade do segurado em categoria profissional considerada especial, mantendo, contudo, a possibilidade de conversão do tempo de trabalho comum em especial. Precedentes do STJ.
12 – Em suma: (a) até 28/04/1995, é possível a qualificação da atividade laboral pela categoria profissional ou pela comprovação da exposição a agente nocivo, por qualquer modalidade de prova; (b) a partir de 29/04/1995, é defeso reconhecer o tempo especial em razão de ocupação profissional, sendo necessário comprovar a exposição efetiva a agente nocivo, habitual e permanentemente, por meio de formulário-padrão fornecido pela empresa; (c) a partir de 10/12/1997, a aferição da exposição aos agentes pressupõe a existência de laudo técnico de condições ambientais, elaborado por profissional apto ou por perfil profissiográfico previdenciário (PPP), preenchido com informações extraídas de laudo técnico e com indicação dos profissionais responsáveis pelos registros ambientais ou pela monitoração biológica, que constitui instrumento hábil para a avaliação das condições laborais.
13 – Saliente-se, por oportuno, que a permanência não pressupõe a exposição contínua ao agente nocivo durante toda a jornada de trabalho, guardando relação com a atividade desempenhada pelo trabalhador. Pacífica a jurisprudência no sentido de ser dispensável a comprovação dos requisitos de habitualidade e permanência à exposição ao agente nocivo para atividades enquadradas como especiais até a edição da Lei nº 9.032/95, visto que não havia tal exigência na legislação anterior.
14 – Especificamente quanto ao reconhecimento da exposição ao agente nocivo ruído, por demandar avaliação técnica, nunca prescindiu do laudo de condições ambientais.
15 – Considera-se insalubre a exposição ao agente ruído acima de 80dB, até 05/03/1997; acima de 90dB, no período de 06/03/1997 a 18/11/2003; e superior a 85 dB, a partir de 19/11/2003.
16 – O Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), instituído pela Lei nº 9.528/97, emitido com base nos registros ambientais e com referência ao responsável técnico por sua aferição, substitui, para todos os efeitos, o laudo pericial técnico, quanto à comprovação de tempo laborado em condições especiais.
17 – Saliente-se ser desnecessário que o laudo técnico seja contemporâneo ao período em que exercida a atividade insalubre. Precedentes deste E. TRF 3º Região.
18 – A desqualificação em decorrência do uso de EPI vincula-se à prova da efetiva neutralização do agente, sendo que a mera redução de riscos e a dúvida sobre a eficácia do equipamento não infirmam o cômputo diferenciado. Cabe ressaltar, também, que a tese consagrada pelo C. STF excepcionou o tratamento conferido ao agente agressivo ruído, que, ainda que integralmente neutralizado, evidencia o trabalho em condições especiais.
19 – Vale frisar que a apresentação de laudos técnicos de forma extemporânea não impede o reconhecimento da especialidade, eis que de se supor que, com o passar do tempo, a evolução da tecnologia tem aptidão de redução das condições agressivas. Portanto, se constatado nível de ruído acima do permitido, em períodos posteriores ao laborado pela parte autora, forçoso concluir que, nos anos anteriores, referido nível era superior.
20 – É possível a conversão do tempo especial em comum, independentemente da data do exercício da atividade especial, consoante o disposto nos arts. 28 da Lei nº 9.711/98 e 57, § 5º, da Lei nº 8.213/91.
21 – O fator de conversão a ser aplicado é o 1,40, nos termos do art. 70 do Decreto nº 3.048/99, conforme orientação sedimentada no E. Superior Tribunal de Justiça.
22 – Na decisão originária, foi reconhecida a especialidade do intervalo de 07/07/1987 a 12/01/1991, pelo exercício da profissão de vigia.
23 – Quanto ao período reconhecido na sentença, laborado em prol do empregador “Algodoeira Lantieri Ltda.”, o Perfil Profissiográfico Previdenciário (ID 96860366 – Pág. 89/92) comprova que o autor exerceu a função de “vigia“, inclusive com o porte de “arma de fogo calibre 38, com a devida autorização de porte de arma, protegendo o patrimônio da empresa”.
24 – A profissão de guarda patrimonial, vigia, vigilante e afins é considerada de natureza especial durante todo o período a que está a integridade física do trabalhador sujeita aos riscos de seu dever de proteger o bem alheio e inibir eventual ação ofensiva, inclusive com a possibilidade de resposta armada.
25 – A reforma legislativa realizada pela Lei nº 12.740/2012, que alterou o art. 193 da CLT, passou a considerar a atividade de vigilante como perigosa, com o adicional de 30%, em virtude da exposição da categoria a roubos ou outras espécies de violência, mesmo não fazendo menção a uso de armas.
26 – Reputa-se perigosa tal função por equiparação da categoria àquelas previstas no item 2.5.7 do Decreto nº 53.831/64, ainda que não tenha sido incluída pelos Decretos nº 83.090/79 e nº 89.312/84, cujos anexos regulamentares encerram classificação meramente exemplificativa.
27 – Assim sendo, à vista do conjunto probatório juntado aos autos, reputa-se enquadrado como especial o período de 07/07/1987 a 12/01/1991.
28 – Conforme contagem de tempo de serviço constante da sentença (ID 96860366 – Pág. 205), somando-se o tempo de serviço incontroverso (resumo de documentos – ID 96860366 – Págs. 103/106) ao rural e especial, reconhecidos nesta demanda, este último convertido em comum, verifica-se que o autor alcançou 34 anos, 3 meses e 16 dias de serviço na data do requerimento administrativo (23/03/2012 – ID 96860366 – Pág. 25), fazendo jus à aposentadoria proporcional por tempo de contribuição deferida na origem.
29 – A correção monetária dos valores em atraso deverá ser calculada de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal até a promulgação da Lei nº 11.960/09, a partir de quando será apurada, conforme julgamento proferido pelo C. STF, sob a sistemática da repercussão geral (Tema nº 810 e RE nº 870.947/SE), pelos índices de variação do IPCA-E, tendo em vista os efeitos ex tunc do mencionado pronunciamento.
30 – Os juros de mora, incidentes até a expedição do ofício requisitório, devem ser fixados de acordo com o Manual de Orientação de Procedimentos para os Cálculos na Justiça Federal, por refletir as determinações legais e a jurisprudência dominante.
31 – Remessa necessária não conhecida. Apelação do INSS parcialmente provida.
Apelação / Remessa Necessária 0007842-46.2013.4.03.6114