Confirmada a revogação do benefício de suspensão condicional do processo a réu que não reparou danos ambientais em área de reserva extrativista

A 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve a sentença do Juízo da 2ª Vara da Seção Judiciária do Acre que condenou o denunciado a reparar o dano causado à Unidade de Conservação Reserva Extrativista Chico Mendes mediante a apresentação de projeto de recuperação da área desmatada pelo réu sem autorização do órgão ambiental competente. Foi revogada também a suspensão condicional do processo ante o não cumprimento pelo acusado das condições estabelecidas no acordo.

A suspensão condicional do processo (sursis processual) é prevista no art. 89 da Lei 9.099/1995. Segundo o normativo, nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a um ano o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime e quando estão presentes, ainda, outros requisitos que autorizam a suspensão condicional da pena.

No TRF1, o réu apelou alegando, entre outros pontos, que a revogação do benefício de suspensão condicional do processo foi ilegal, porque não teria havido a oitiva do acusado (ato de ouvir as testemunhas ou as partes de um processo judicial), violando os princípios do contraditório e da ampla defesa.

Em seu voto, a relatora, desembargadora federal Maria do Carmo Cardoso, ressaltou que na vistoria realizada pelo ICMBio ficou claro que o acusado não só não reparou o dano como continuou a criar gado no local que deveria preservar. Esse fato inclusive teria levado a autarquia a ingressar com ação de reintegração de posse contra o denunciado a fim de impedir que ele continuasse a explorar a área da reserva. “Ainda que o réu pudesse justificar o cumprimento de uma das condições estabelecidas para o sursis processual, é indiscutível que a principal delas, proteger e recuperar a área degradada, foi relegada pelo apelante. E, tal, por si, justifica a manutenção do despacho que revogou a suspensão condicional do processo”, explicou a magistrada.

A desembargadora federal salientou também que não há como falar em ofensa ao contraditório e à ampla defesa quando está demonstrado nos autos que não houve reparação do dano desde o início da suspensão do processo até a prolação da sentença. “O descumprimento de causas que impõe revogação obrigatória do sursis, de acordo com jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, prescinde da intimação do beneficiário e dispensa até mesmo justificação”, ressaltou. Para a magistrada, a única ressalva seria caso fosse impossível ao réu cumprir as determinações do acordo, mas, nos autos, estava claro não se tratar de agricultor hipossuficiente ou que agia sob estado de necessidade.

O recurso ficou assim ementado:

PENAL E PROCESSUAL PENAL. CRIME AMBIENTAL. ART. 40 COMBIANDO COM O § 1º DO ART. 40-A DA LEI 9.605/1998. DESMATAMENTO E EXPLORAÇÃO ECONÔMICA DE RESERVA EXTRATIVISTA. MATERIALIDADE E AUTORIA COMPROVADAS. NULIDADE DA REVOÇÃO DO SURSIS PROCESSUAL AFASTADA. DESCLASSIFICAÇÃO PARA O DELITO DO ART. 50 DA LEI 9.605/1998. NÃO CABIMENTO. DOSIMETRIA DA PENA. CONFISSÃO QUALIFICADA. APLICAÇÃO DA ATENUANTE,

1.    O descumprimento de causas que impõe revogação obrigatória da suspensão condicional do processo, de acordo com jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, prescinde da intimação do beneficiário, e dispensa até mesmo justificação. Precedentes: HC 358.370/SC, DJe de 25/9/2017, e RHC 39.396/RJ, DJe de 17/9/2013.

2.    Conquanto nos autos do Habeas Corpus 315235/RS (DJe de 27/4/2015), o STJ tenha excepcionado a regra para julgar que o inadimplemento da condição de reparação de danos implica a intimação prévia do acusado, de modo a possibilitar que justifique o descumprimento do pactuado, no mesmo julgado entendeu que, se da decisão revogatória da benesse, for intimada a defesa, para recorrer e obter, se for o caso, retratação da decisão pelo juiz ou sua revogação, tal deficiência fica superada, mesmo que a defesa permaneça inerte. Esta a hipótese dos autos, descabe falar em nulidade do despacho que revogou o benefício de suspensão condicional do processo.

3.    Ademais, não há de se falar em ofensa ao contraditório e à ampla defesa, quando demonstrado nos autos com fatos incontestáveis que desde o início da suspensão do processo, e até a prolação da sentença, não houve reparação do dano. A Lei 9.605/1998, ao prever, nos crimes ambientais, a possibilidade de suspensão do processo, condiciona a declaração de extinção da punibilidade à elaboração de laudo de constatação de reparação do dano ambiental (art. 28, I), e tal inexiste nos autos.

4.    Descabida a pretensão de ver desclassificada a conduta do art. 40 para a do art. 50, ambos da Lei 9.605/1998, sob alegação de que a área desmatada (reserva extrativista) não estaria inclusa entre aquelas descritas no § 1º do art. 40 como Unidades de Conservação.

5.    O § 1º do art. 40 foi revogado pela Lei 9.9805/2000, e com ela foi incluído, em substituição àquele, o § 1º ao art. 40-A (o art. 40-A não trouxe nova ou diversa figura típica, porque foi vetado, mantendo-se, pois, incólume o tipo penal descrito no art. 40). Assim, vige a figura típica do art. 40 combinada com o § 1º do art. 40-A, que entende por Unidades de Conservação de Uso Sustentável, entre outras, as Reservas Extrativistas.

6.    Ademais, a desclassificação pretendida pela defesa acarretaria evidente reformatio in pejus, uma vez que a conduta do réu, claramente, não se amolda ao tipo do art. 50 da Lei 9.605/1998, mas ao do art. 50-A, que traz pena bem superior à do art. 40. Logo, por todos os ângulos que se examine, o pedido não tem amparo no ordenamento jurídico.

 

7.    Apelação a que se dá parcial provimento, para aplicar a atenuante da confissão espontânea, e reduzir as penas do réu de 1 (um) ano e 4 (quatro) meses de reclusão e 39 (trinta e nove) dias-multa para 1 (um) ano e 2 (dois) meses de reclusão e 30 (trinta) dias-multa.

A decisão foi unânime.

Processo: 0002785-39.2010.4.01.3000

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