Ela alegou que era obrigada a se apresentar excessivamente maquiada para o trabalho.
A Primeira Turma do Tribunal Superior do Trabalho rejeitou recurso da Gol Linhas Aéreas S.A. contra decisão que a condenou a pagar R$ 80 mensais a uma comissária de voo de Porto Alegre (RS) a título de ressarcimento por gastos com maquiagem e manicure durante o período do contrato de trabalho. Segundo o colegiado, a empresa não indicou corretamente o trecho da decisão que pretendia rediscutir no TST.
“Sempre impecável”
Contratada pela Webjet Linhas Aéreas S.A. e dispensada em março de 2013 pela Gol, que assumira a outra empresa aérea, a comissária sustentou, na reclamação trabalhista, que era obrigada, em todas as jornadas de trabalho, a se apresentar “de forma impecável”, devidamente maquiada, com o cabelo cuidado e as unhas pintadas. Por isso, pediu ressarcimento de, no mínimo, R$ 150 mensais.
Guia de padronização
O juízo de primeiro grau, ao deferir o pedido, frisou que o trabalhador não pode arcar com os custos atinentes à execução de sua atividade, que seriam de responsabilidade do empregador. De acordo com a sentença, ficou demonstrado, com base em documentos (entre eles um “guia de padronização”), que a empresa aérea exigia unhas e maquiagem impecáveis de suas comissárias de bordo, “inclusive determinando a compra de produtos importados, caso necessário”. Ainda de acordo com o juízo, a apresentação, quando exigida em padrão específico pelo empregador, caracteriza-se como meio para a execução do trabalho.
A condenação foi mantida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) quanto à obrigação de ressarcimento, mas o valor foi reduzido para R$ 80, com base na média de viagens e nos custos dos produtos e, também, no fato de que, em depoimento pessoal, a empregada afirmou que não sabia quanto gastava por mês com maquiagem.
Escolha pessoal
Na tentativa de trazer a discussão ao TST, a Gol argumentou que a solicitação de apresentação formal para os empregados estaria “longe de configurar um dress code fora do padrão ou que exija gastos extras que não fossem do cotidiano”. Para a empresa, o uso dos produtos está vinculado à esfera estritamente pessoal e “são de opção e escolha de tipo diverso para cada mulher”.
Mas, segundo o relator, ministro Hugo Scheuermann, a empresa não cumpriu o requisito de indicar o trecho da decisão contra a qual recorre que resume o prequestionamento da controvérsia. No caso, o trecho da decisão do TRT reproduzido pela Gol trata do valor da indenização, que não foi objeto do recurso de revista. Diante disso, a Turma negou provimento ao agravo de instrumento.
O recurso ficou assim ementado:
AGRAVO DE INSTRUMENTO DA RECLAMADA. 1. NULIDADE. CONTRADITA DE TESTEMUNHA. INOBSERVÂNCIA DO INCISO I DO §1º-A DO ARTIGO 896 DA CLT. TRANSCRIÇÃO QUASE INTEGRAL DA DECISÃO REGIONAL. AUSÊNCIA DE DELIMITAÇÃO DA TESE REGIONAL PARA COMPROVAÇÃO DO PREQUESTIONAMENTO DA MATÉRIA. 1.1. O acórdão regional foi publicado na vigência da Lei 13.015/2014, portanto, plenamente aplicável à hipótese o artigo 896, § 1º-A, I, da CLT, segundo o qual “sob pena de não conhecimento, é ônus da parte indicar o trecho da decisão recorrida que consubstancia o prequestionamento da controvérsia objeto do recurso de revista” – ônus do qual a parte não se desincumbiu. 1.2. A transcrição quase integral do tema recorrido sem realce da parte impugnada não atende o disposto no artigo 896, § 1º-A, I, da CLT, por inviabilizar a demonstração precisa do fundamento do julgado que estaria em confronto com os dispositivos invocados pelo recorrente.
2. HORAS EXTRAS. PERÍODO APÓS O CORTE DOS MOTORES. MATÉRIA FÁTICA. 2.1. Na hipótese, o Tribunal Regional consigna que “não socorre a reclamada o argumento de que os 30 min após o corte dos motores estariam computados na jornada da reclamante, pois a ré não faz qualquer demonstração dessa alegada consideração”, ressaltando, inclusive, que “observadas outras situações semelhantes, em que não considerados os 30 min após o corte dos motores, a exemplo, dia 27/4/2011 (Id c5faf1f, pg. 11).”. 2.2. Entendimento em sentido diverso demandaria o reexame do acervo probatório, o que não encontra guarida nesta instância extraordinária, a teor da Súmula 126 do TST.
3. HORAS DE SOBREAVISO E DE RESERVA. RECURSO DE REVISTA QUE NÃO ATACA O FUNDAMENTO APRESENTADO NA DECISÃO REGIONAL. 3.1. A Corte de origem, no que se refere às horas de sobreaviso, consignou que “São sem objeto as razões recursais que pretendem afastar as horas de sobreaviso, aduzindo que a reclamante não estava à disposição da empregadora, pois a sentença tão somente decidiu pelo pagamento das horas já reconhecidas nos cartões ponto da autora como sendo de ‘ sobreaviso’ ” e que “são as próprias anotações da ré que servirão de base para a apuração em liquidação de sentença.”. Já com relação às horas de reserva registrou que “apesar de a reclamada intitular o item também como ‘ horas de sobreaviso e de reserva’ , não apresentou razões quanto às ultimas.” 3.2. O recorrente não se contrapõe aos fundamentos apresentados pelo Tribunal Regional, limitando-se a destacar genericamente a inexistência de horas de sobreaviso e de reserva. 3.3. Aplicação da Súmula 422, I, do TST.
4. INDENIZAÇÃO. USO DE MAQUIAGEM E CUIDADOS PESSOAIS. ART. 896, § 1º-A, I, DA CLT. DESCUMPRIMENTO. Inviável o recurso de revista, interposto sob a égide da Lei 13.015/2014, pois a parte recorrente não observou o requisito do art. 896, § 1º-A, I, da CLT.
Agravo de instrumento conhecido e não provido.
RECURSO DE REVISTA DA RECLAMADA. VERBA COMPENSAÇÃO ORGÂNICA. PREVISÃO EM NORMA COLETIVA. 1. Na hipótese, a Corte de origem manifestou o entendimento de que “Ainda que a redação da cláusula normativa estabeleça sua natureza indenizatória, concluo que a verba foi instituída com a finalidade de remunerar o próprio exercício da função de aeronauta. Trata-se, portanto, de verba com caráter salarial, devendo integrar o cálculo das parcelas variáveis apuradas com base na remuneração.” 2. Contudo, esta Corte Superior tem reconhecido a validade de norma coletiva que estabelece a natureza indenizatória da verba denominada “compensação orgânica”, a qual compõe a remuneração fixa do aeronauta, correspondendo a 20% (vinte por cento) de seu valor. Julgados neste sentido.
Recurso de revista conhecido e provido, no tema.
HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. 1. Pacificado nesta Corte o entendimento de que na “Justiça do Trabalho, a condenação ao pagamento de honorários advocatícios não decorre pura e simplesmente da sucumbência, devendo a parte, concomitantemente: a) estar assistida por sindicato da categoria profissional; b) comprovar a percepção de salário inferior ao dobro do salário mínimo ou encontrar-se em situação econômica que não lhe permita demandar sem prejuízo do próprio sustento ou da respectiva família. (art. 14,§1º, da Lei nº 5.584/1970)” (Súmula 219/I/TST). 2. No caso concreto, o e. Tribunal regional, ao deferir o pedido de pagamento dos honorários advocatícios, a despeito da ausência de assistência sindical, incorreu em contrariedade ao referido Verbete.
Recurso de revista conhecido e provido, no tema.
Processo: ARR-21657-59.2014.5.04.0005