Como a conversão foi imposta, o empregado tem direito ao pagamento em dobro.
A Subseção I Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1) do Tribunal Superior do Trabalho decidiu que, quando o empregado é obrigado a converter 1/3 de suas férias em abono pecuniário, o período deverá ser pago em dobro. No entanto, o valor pago a esse título na época das férias deve ser considerado para efeito da aplicação da penalidade.
Obrigação
O caso teve início em reclamação trabalhista ajuizada por um empregado do HSBC Bank Brasil S. A. que sustentou que era coagido a vender dez dias de suas férias. Segundo ele, a obrigação contraria o princípio de que as férias de 30 dias são norma de saúde e higiene pública garantida pela Constituição da República, razão pela qual teria direito ao pagamento em dobro de todo o período de descanso. De forma sucessiva, requereu o pagamento em dobro ao menos dos 10 dias vendidos compulsoriamente à instituição bancária.
O juízo da 22ª Vara do Trabalho de Porto Alegre e o Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS) entenderam que a prática era lesiva ao empregado, mas concluíram que a remuneração de férias havia sido paga e limitaram a condenação ao pagamento simples do período, acrescido do abono de 1/3. No entanto, a Segunda Turma do TST, ao julgar o recurso de revista do bancário, entendeu que a situação concede ao empregado os mesmos direitos previstos no artigo 137 da CLT, que determina o pagamento em dobro do período de férias não usufruído na época própria.
Pagamento triplo
Nos embargos à SDI-1, o banco sustentou que, embora o empregado tenha o direito de receber em dobro o período de férias não usufruído, a condenação imposta pela Segunda Turma representa, na verdade, pagamento triplo, uma vez que já havia sido pago o valor correspondente a dez dias.
O relator, ministro Vieira de Mello Filho, observou que a conversão de 1/3 do período de férias em abono pecuniário é um direito do empregado, que tem direito, a título indenizatório, ao pagamento da remuneração de férias dos dias correspondentes. Não havendo, contudo, livre escolha nesse sentido, mas imposição do empregador, o que se observa é o descumprimento do que preceituam os artigos 143 da CLT e 7º, inciso XVII, da Constituição da República, sendo aplicável a sanção de pagamento em dobro “no intuito de coibir a prática que compromete o direito ao descanso anual”.
No caso, entretanto, constatado que o empregado já recebeu a remuneração de férias do período não usufruído, esse valor deve ser tomado em consideração na aplicação da penalidade. “Conclusão em sentido contrário ensejaria o pagamento da remuneração de férias não em dobro, como preceitua a CLT, mas em triplo, configurando enriquecimento sem causa”, concluiu.
O recurso ficou assim ementado:
I – RECURSO DE REVISTA DO RECLAMANTE INTERPOSTO ANTES DA LEI 13.015/2014 .
1 – REPOUSOS SEMANAIS REMUNERADOS. REFLEXOS. OJ 394 DA SDI-1/TST. A Súmula 376, II, do TST prevê que as horas extras habitualmente prestadas integram o cálculo dos haveres trabalhistas, o que inclui o repouso semanal remunerado (RSR). Assim, tendo em vista que as horas extras habituais repercutem no repouso semanal remunerado e nas demais parcelas trabalhistas, não se pode admitir que o cálculo de tais parcelas leve em consideração o valor de RSR já majorado pela prestação de labor extraordinário habitual, sob pena de bis in idem . Nesse sentido, dispõe a OJ 394 da SDI-1/TST. Logo, ao indeferir os reflexos em questão, o Tribunal Regional decidiu em consonância com a jurisprudência desta Corte Superior. Recurso de revista não conhecido.
2 – FÉRIAS. VENDA POR IMPOSIÇÃO DO EMPREGADOR. PAGAMENTO EM DOBRO. O Tribunal Regional consignou que o reclamante vendia uma parcela de suas férias por imposição patronal, in verbis : ” A prova oral produzida (acima transcrita) confirma a impossibilidade de fruição do período de trinta dias de férias, bem como a obrigatoriedade da ‘ venda’ de dez dias “. De acordo com o entendimento do TST sobre o tema, essa situação concede ao empregado os mesmos direitos previstos pelo artigo 137 da CLT, devendo o empregador pagar em dobro o período de férias não usufruído em decorrência da venda por imposição patronal. Precedentes. Recurso de revista conhecido e provido.
II – RECURSO DE REVISTA DAS RECLAMADAS INTERPOSTO ANTES DA LEI 13.015/2014 .
1 – AÇÃO COM PEDIDOS IDÊNTICOS AJUIZADA CONTRA O MESMO EMPREGADOR POR TESTEMUNHA. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. SÚMULA 357/TST. Nos termos da Súmula 357/TST, o fato de uma testemunha litigar contra o mesmo reclamado, por si só, não a torna suspeita. Além disso, a jurisprudência deste Tribunal Superior tem entendido que o referido verbete também se aplica nas hipóteses em que as reclamações trabalhistas (da parte e da testemunha) possuem pedidos idênticos. Precedentes. Assim, tendo em vista que não há registro de outros fatores que indiquem a suspeição da testemunha, deve ser rejeitada a alegação de que o indeferimento da contradita gerou cerceio de defesa. Recurso de revista não conhecido.
2 – VÍNCULO DE EMPREGO. ENQUADRAMENTO NA CATEGORIA DOS TRABALHADORES BANCÁRIOS. SÚMULA 126/TST. À luz dos fatos e provas constantes dos autos, o Tribunal de origem concluiu que o autor tinha atribuições relacionadas à atividade-fim do HSBC Bank Brasil S.A. – Banco Múltiplo. Assim, manteve a decisão que reconheceu o vínculo de emprego diretamente com o banco reclamado e, consequentemente, garantiu ao reclamante os diretos específicos dos trabalhadores bancários. Nesse contexto, para se acolher a tese recursal em sentido contrário, seria necessário o reexame fático-probatório, o que é vedado pela Súmula 126/TST. Recurso de revista não conhecido.
3 – AUSÊNCIA DE ANOTAÇÃO DA CTPS. MULTA DIÁRIA. POSSIBILIDADE. SÚMULA 333/TST. A jurisprudência deste Tribunal Superior entende que a existência de autorização legal para que a Secretaria da Vara realize a anotação da CTPS, na hipótese de inércia do empregador, não afasta a possibilidade de aplicação da multa diária em caso de descumprimento da obrigação. Com efeito, o artigo 461, §§ 4º e 5º, do CPC/1973 (artigos 536 e 537 do CPC/2015) concede o amparo legal necessário ao uso da penalidade em questão. Precedentes. Incidência da Súmula 333/TST. Recurso de revista não conhecido.
4 – JORNADA DE TRABALHO. INVALIDADE DOS REGISTROS DE JORNADA. SÚMULA 126/TST. A Corte de origem decidiu com base nos fatos e provas constantes dos autos, como se verifica no seguinte trecho da decisão recorrida: ” O próprio preposto do primeiro reclamado noticia em seu depoimento, à fl. 521-verso, ser ‘o coordenador quem repassa as informações de retificação de jornada lançadas de forma manuscrita no RA para o ponto eletrônico do funcionário; confirma que o coordenador acessa o ponto eletrônico do funcionário; caso tenha ficado em branco o ponto eletrônico, com base no RA o horário é preenchido’. Não bastassem tais afirmações para invalidar os registros de frequência trazidos aos autos (fls. 297/346), as duas únicas testemunhas ouvidas, ambas a convite do reclamante (fls. 521-verso/522-verso), confirmam não espelharem estes a jornada efetivamente realizada “. Dessa forma, não se sustentam as alegações das recorrentes no sentido de que o autor não arcou com seu ônus probatório nem de que inexiste prova robusta do direito pleiteado. Recurso de revista não conhecido.
5 – HORAS EXTRAS. REFLEXOS NOS SÁBADOS. PREVISÃO EM ACORDO COLETIVO. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 113/TST. O Tribunal de origem deferiu os reflexos das horas extras no cálculo da remuneração dos sábados com base em previsão constante de norma coletiva. Tendo em vista a existência de disposição mais benéfica ao trabalhador em convenção coletiva, não há como se acatar a argumentação recursal relativa à incidência da Súmula 113/TST à hipótese. Com efeito, esta Corte Superior tem entendido que a referida súmula não abrange os casos em que disposição coletiva previr a concessão dos reflexos referentes aos sábados. Precedentes. Não se trata, portanto, do reconhecimento de que os sábados são dias de repouso semanal remunerado, mas sim da mera aplicação das convenções coletivas pactuadas pela categoria. Recurso de revista não conhecido.
6 – FÉRIAS. VENDA OBRIGATÓRIA POR IMPOSIÇÃO PATRONAL. SÚMULA 126/TST. A Corte Regional reconheceu a existência de irregularidades na venda das férias, o que foi comprovado por meio das provas produzidas durante a instrução. A partir desse registro fático, não há como se conhecer do recurso de revista das empresas, uma vez que eventual provimento do apelo demandaria a reanálise de fatos e provas. Com efeito, em virtude do óbice imposto pela Súmula 126/TST, esta instância extraordinária não pode alterar a conclusão de que uma parcela das férias do empregado foi vendida por imposição patronal. Recurso de revista não conhecido.
7 – MULTA CONVENCIONAL. CONTROVÉRSIA ESCLARECIDA JUDICIALMENTE. POSSIBILIDADE. A jurisprudência desta Corte Superior entende que o fundamento para a aplicação de multa convencional é o descumprimento da cláusula coletiva, sem indicar qualquer exceção. É o que se infere, por exemplo, da Súmula 384, II, do TST. Dessa forma, ainda que o Poder Judiciário seja o responsável pelo reconhecimento de que a parte não observou as disposições normativas com as quais se comprometeu, é devida a multa convencional. Precedentes. Recurso de revista não conhecido.
8 – HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. AUSÊNCIA DE CREDENCIAL SINDICAL. SÚMULA 219/TST. Nesta Justiça especializada, os honorários advocatícios são devidos apenas quando verificados, de forma simultânea, os seguintes requisitos: (i) assistência sindical; e (ii) percepção de salário inferior ao dobro do mínimo legal ou impossibilidade de se pleitear em juízo sem comprometimento do próprio sustento ou da família. Esse é o entendimento consagrado nas Súmulas 219 e 329 do TST. Nestes autos, apesar de o reclamante ser beneficiário da justiça gratuita, não há registro de que está assistido pelo sindicato de sua categoria profissional. Assim, ao afastar a incidência das Súmulas mencionadas para condenar as reclamadas ao pagamento da verba honorária, o Tribunal Regional divergiu do posicionamento consolidado desta Corte Superior. Recurso de revista conhecido e provido.
Por unanimidade, a SDI-1 deu provimento ao recurso e restabeleceu a decisão do TRT.
Processo: E-ED-RR-104300-96.2009.5.04.0022