USP poderá descontar a totalidade dos dias de greve realizada em 2016

A decisão segue o entendimento majoritário do TST de que a greve suspende o contrato de trabalho.

A Seção Especializada em Dissídios Coletivos (SDC) do Tribunal Superior do Trabalho decidiu nesta terça-feira (19), por maioria, autorizar a Universidade de São Paulo (USP) a descontar dos salários dos empregados o valor relativo à totalidade dos dias em que eles participaram da greve realizada em 2016. A decisão segue o entendimento predominante na SDC de que a greve suspende o contrato de trabalho e, portanto, não é devido o pagamento dos dias em que não houve prestação de serviço em razão da paralisação.

Greve

A paralisação ocorreu em maio de 2016. Segundo o Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp), o movimento visava à preservação dos postos de trabalho, à reposição salarial das perdas inflacionárias e à manutenção de outras cláusulas de natureza social e foi comunicado à universidade nos prazos estabelecidos na Lei de Greve (Lei 7.783/1989).

Como a USP começou a descontar os dias em que houve paralisação, o Sintusp ajuizou dissídio coletivo de greve no Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região para pedir o fim dos descontos e a fixação de reajuste salarial e outras condições. O TRT declarou a greve não abusiva, determinou o pagamento dos dias em que não houve prestação de trabalho e concedeu estabilidade aos empregados desde a deflagração do movimento até 90 dias após o julgamento do dissídio coletivo.

Suspensão do contrato

O recurso ordinário da USP começou a ser julgado em agosto de 2018. O relator, ministro Ives Gandra Martins Filho, lembrou que, em relação ao tema, predomina na SDC o entendimento de que, sendo a greve uma hipótese de suspensão do contrato de trabalho, não é devido o pagamento dos dias em que não houver trabalho. “Excetuam-se dessa regra apenas os casos em que as partes negociarem de forma diversa ou, ainda, quando o movimento for motivado por descumprimento de regras normativas ou legais pelo empregador, como não pagamento de salários ou más condições de trabalho”, explicou.

Entre os precedentes citados pelo relator estão os de greves dos metroviários de Minas Gerais e de São Paulo e de empregados da área de limpeza urbana de São Paulo.

STF

O ministro ressaltou ainda que o Supremo Tribunal Federal, no julgamento de recurso ordinário com repercussão geral (RE 693456), fixou a tese de que a administração pública deve descontar os dias de paralisação decorrentes de greve “em virtude da suspensão do vínculo funcional que dela decorre, permitida a compensação em caso de acordo”.

Na sessão dessa terça-feira, o julgamento foi retomado com o voto-vista do vice-presidente do TST, ministro Renato de Lacerda Paiva, que seguiu o relator. O ministro lembrou que, desde 2007, o STF entende que a Lei de Greve também se aplica aos servidores públicos estatutários. “Ainda que tenha sido declarada lícita a greve da USP e que o direito de greve tenha sido exercido sem abusos, impõem-se consequências jurídicas para aqueles servidores que aderiram à paralisação”, afirmou.

Divergência

O ministro Maurício Godinho Delgado divergiu do relator e votou pelo desconto de 50% dos dias de paralisação e pela compensação dos 50% restantes. Ele foi seguido pela ministra Kátia Magalhães Arruda.

O recurso ficou assim ementado:

A) RECURSO ORDINÁRIO DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO – USP.

I) DISSÍDIO COLETIVO DE GREVE – INSTAURAÇÃO PELO SINDICATO PROFISSIONAL – LEGITIMIDADE ATIVA AD CAUSAM .

1. Após o cancelamento da Orientação Jurisprudencial 12, o entendimento desta SDC direciona-se no sentido de reconhecer a legitimidade de sindicato obreiro para a instauração de dissídio coletivo de greve. Assim, são partes legítimas para a propositura dessa ação todos aqueles que são atingidos pelo movimento paredista, isto é, os empregadores e seus respectivos sindicatos, os próprios sindicatos profissionais para promotores da greve, para superar o impasse nas negociações, e, ainda, o Ministério Público do Trabalho.

2. In casu , o Regional rejeitou a preliminar de ilegitimidade de parte, sob o fundamento de que é pacífico o entendimento de que o sindicato profissional é parte legítima para a propositura do dissídio coletivo de greve.

3. Assim, estando a decisão impugnada em consonância com a jurisprudência uniforme desta Seção, nega-se provimento ao recurso ordinário quanto à prefacial.

Recurso ordinário desprovido.

II) GREVE – HIPÓTESE DE SUSPENSÃO CONTRATUAL – INDEVIDO O PAGAMENTO DOS DIAS DE PARALISAÇÃO .

1. Predomina nesta Seção o entendimento de que, sendo a greve uma hipótese de suspensão do contrato de trabalho, não é devido o pagamento dos dias em que não houver labor em virtude da paralisação. Excetuam-se dessa regra apenas os casos em que as partes negociarem de forma diversa ou, ainda, quando o movimento paredista for motivado por descumprimento de regras normativas ou legais pelo empregador, tal como nas hipóteses de não pagamento de salários ou de más condições de trabalho. Nesses casos, o período de paralisação será considerado como de interrupção do contrato de trabalho, sendo devido o pagamento dos salários.

2. Ademais, o STF no julgamento do RE 693456/RJ, relativo ao Tema 531 da tabela de Repercussão Geral, fixou a de que tese “a administração pública deve proceder ao desconto dos dias de paralisação decorrentes do exercício do direito de greve pelos servidores públicos, em virtude da suspensão do vínculo funcional que dela decorre, permitida a compensação em caso de acordo. O desconto será, contudo, incabível se ficar demonstrado que a greve foi provocada por conduta ilícita do Poder Público “.

3. In casu , o Regional entendeu ser devido o pagamento dos salários pelo simples fato de considerar o movimento como não abusivo, não tendo enquadrado o caso nas excepcionalidades admitidas pelo TST.

4. Desse modo, tendo em vista que o caso concreto não se enquadra em nenhuma das exceções admitidas pela jurisprudência, conclui-se que o acórdão regional merece reparos, uma vez que não há de se falar em restituição dos descontos salariais efetuados pela USP quanto aos dias de paralisação.

5. Do exposto, dou provimento ao recurso ordinário da USP para excluir a determinação de pagamento dos dias de paralisação em virtude da greve.

Recurso ordinário provido.

B) RECURSO ORDINÁRIO DO SINDICATO DOS TRABALHADORES DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO – SINTUSP .

I) DESFUNDAMENTAÇÃO PARCIAL DO APELO – PRINCÍPIO DA DIALETICIDADE RECURSAL.

1. O art. 1.010 do CPC/15, consagrando o princípio da dialeticidade recursal, prevê que devem constar dos recursos, além da exposição do fato e do direito, as razões do pedido de reforma. Nesse mesmo sentido segue a Súmula 422, I, do TST, que exige o ataque, no recurso, aos fundamentos da decisão combatida, e não o mero pedido de revisão.

2. In casu , quanto às cláusulas sociais, verifica-se que a Parte Recorrente não impugna o fundamento do Regional de que as reivindicações do Suscitante dizem respeito a matérias exclusivas do âmbito administrativo, atreladas à disponibilidade orçamentária, e que extrapolam os limites do Poder Normativo da Justiça do Trabalho.

3. Assim sendo, apenas a questão relativa às reivindicações econômicas, impugnada fundamentadamente no recurso, é passível de reexame por esta instância, deixando de se conhecer do apelo quanto às cláusulas sociais.

Recurso ordinário conhecido apenas parcialmente.

II) DISSÍDIO COLETIVO – PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO – CLÁUSULAS DE NATUREZA ECONÔMICA – IMPOSSIBILIDADE JURÍDICA DO PEDIDO

1. A Orientação Jurisprudencial 5 desta SDC prevê a possibilidade jurídica de ajuizamento de dissídio coletivo em face pessoas jurídicas de direito público apenas para apreciação de cláusulas de natureza social, não sendo possível o estabelecimento de cláusulas que acarretem encargos financeiros ao ente público .

2. In casu , o Regional acolheu a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, e extinguiu o processo sem resolução do mérito quanto às cláusulas econômicas e com repercussão financeira.

3. Assim, estando a decisão regional em consonância com a jurisprudência desta Seção, nega-se provimento ao recurso ordinário do SINTUSP.

Recurso ordinário desprovido.

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO – OMISSÃO – CONDENAÇÃO AO PAGAMENTO DE HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS – INOVAÇÃO RECURSAL – INVERSÃO DAS CUSTAS PROCESSUAIS – SUCUMBÊNCIA TOTAL DO SINDICATO SUSCITANTE – ACOLHIMENTO PARCIAL.

1. Nos termos do art. 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, os embargos de declaração se prestam a esclarecer obscuridades, eliminar contradições e suprir omissões acaso existentes em qualquer decisão judicial, bem como corrigir eventuais erros materiais. O art. 897-A da CLT estabelece que os embargos de declaração também se destinam a imprimir efeito modificativo na decisão embargada nos casos de omissão e contradição no julgado e manifesto equívoco no exame dos pressupostos extrínsecos do recurso.

2. In casu , a USP sustenta que o acórdão recorrido quedou-se silente quanto à inversão das custas processuais, bem como quanto à condenação do Sindicato Suscitante ao pagamento de honorários advocatícios.

3. Em que pese se verifique que constitui inovação recursal a argumentação da Embargante quanto aos honorários advocatícios, revela-se necessário o acolhimento dos embargos de declaração para sanar a omissão alegada no que tange à inversão do ônus sucumbencial .

4. Com efeito, uma vez provido o recurso ordinário da USP para excluir a determinação de pagamento dos dias de paralisação em virtude de greve, tornou-se o Sindicato Suscitante totalmente sucumbente quanto às pretensões discutidas nos autos.

5. Assim, deve ser invertido o ônus da sucumbência, ficando a cargo do SINTUSP o pagamento das custas processuais.

Embargos de declaração parcialmente acolhidos para sanar omissão .

Processo: RO-1001809-70.2016.5.02.0000

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