A Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), por unanimidade, negou recurso em mandado de segurança interposto por empresa que pedia a liberação de aeronave sem nenhum gravame. O avião está formalmente registrado em nome da empresa, mas seria de propriedade de um dos investigados pela Polícia Federal na Operação Fidúcia, por suspeita de fraudes em empréstimos concedidos pela Caixa Econômica Federal.
O recurso foi apresentado contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5) que condicionou a liberação da aeronave à nomeação de um representante da sociedade como depositário fiel e à inscrição de gravame do bem no órgão competente.
De acordo com as investigações, a aeronave seria fruto de lavagem de dinheiro. No despacho de indiciamento, a autoridade policial, ao tratar da lavagem de dinheiro, afirmou que, para ocultar a verdadeira origem do produto adquirido com dinheiro ilícito, os investigados se utilizaram de nome falso, “laranjas” e parentes para efetuar o registro formal da propriedade de bens móveis e imóveis.
Suspeitas
Para o relator no STJ, ministro Reynaldo Soares da Fonseca, os indícios de que a aeronave seria propriedade de investigado permitem as condicionantes impostas pelo TRF5 para a liberação do bem.
“Diferentemente do que sustenta a impetrante, não existiu nenhum laconismo nos acórdãos proferidos pelo TRF da 5ª Região, em sede de embargos de declaração, tendo tais julgados deixado claro que a imposição de medida cautelar sobre a aeronave em questão se justificava na medida em que haveria fortes suspeitas de que, embora tenha sido sua propriedade registrada em nome da pessoa jurídica impetrante, seu real proprietário seria o sócio da impetrante investigado na Operação Fidúcia”, afirmou.
O ministro destacou que o acórdão segue o entendimento formado no STJ no que diz respeito à possibilidade de extensão do sequestro a bens de terceiros não envolvidos diretamente no ilícito penal, desde que devidamente fundamentada a decisão em indícios veementes de que tais bens foram adquiridos ou construídos com finanças produto de crime.
Propriedade
“A jurisprudência desta corte tem exigido a prova da real propriedade do bem apreendido como requisito para sua liberação”, disse Reynaldo Soares da Fonseca.
Segundo o relator, a recorrente não demonstrou ser a legítima proprietária do avião, o que exigiria não só a comprovação de que o bem está formalmente em seu nome, como também a prova de que possui recursos financeiros suficientes para arcar com o preço pago por ele e de que tais recursos não são provenientes das atividades ilegais praticadas por seu sócio administrador.
“O que se constata é que há uma clara dúvida sobre o real proprietário da aeronave em questão, assim como sobre a possibilidade de ter sido ela adquirida com produto de crime”, afirmou o ministro ao negar o recurso em mandado de segurança.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. AERONAVE LIBERADA MEDIANTE NOMEAÇÃO DE FIEL DEPOSITÁRIO E INSCRIÇÃO DE GRAVAME DO BEM NO ÓRGÃO COMPETENTE. SUSPEITA DE QUE O BEM FOI ADQUIRIDO COM PRODUTO DE CRIME DE SÓCIO ADMINISTRADOR DA EMPRESA IMPETRANTE ACUSADO, EM AÇÃO PENAL, DE FRAUDE NA CONTRATAÇÃO DE EMPRÉSTIMOS COM A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL. IMPOSSIBILIDADE DE LIBERAÇÃO DA AERONAVE SEM GRAVAMES. NULIDADES EM JULGAMENTO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO, NO SEGUNDO GRAU DE JURISDIÇÃO, INEXISTENTES.
1. Se os embargos de declaração foram julgados na sessão seguinte àquela em que o recurso foi concluso ao Relator, desnecessária a prévia inclusão dos aclaratórios em pauta, já que obedecida a regra do § 1º do art. 1.024 do CPC⁄2015, que estabelece que, “Nos tribunais, o relator apresentará os embargos em mesa na sessão subsequente, proferindo voto, e, não havendo julgamento nessa sessão, será o recurso incluído em pauta automaticamente”.
É desarrazoado cogitar que os embargos de declaração devem ser julgados em 5 (cinco) dias a contar da data do protocolo do recurso, já que, antes de ser ele concluso ao Relator, não existe nenhum contato do julgador com as alegações postas no recurso.
2. Não padece de laconismos ou de nulidade por falta de fundamentação o julgado que, examinando embargos de declaração, deixa claro que a imposição de medida cautelar sobre a aeronave em questão se justificava na medida em que haveria fortes suspeitas de que, embora tenha sido sua propriedade registrada em nome da pessoa jurídica impetrante, seu real proprietário seria o sócio da impetrante investigado na “Operação Fidúcia”.
3. A restituição das coisas apreendidas, mesmo após o trânsito em julgado da ação penal, está condicionada tanto à ausência de dúvida de que o requerente é seu legítimo proprietário, quanto à licitude de sua origem e à demonstração de que não foi usado como instrumento do crime, conforme as exigências postas nos arts. 120, 121 e 124 do Código de Processo Penal, c⁄c o art. 91, II, do Código Penal.
4. Não há ilegalidade na extensão do sequestro a bens de terceiros não envolvidos diretamente no ilícito penal, desde que devidamente fundamentada a decisão em indícios veementes de que tais bens foram adquiridos ou construídos com finanças produto de crime.
5. Existindo evidências de que a empresa impetrante foi beneficiada com valores de financiamentos ilegalmente obtidos perante a Caixa Econômica Federal, mediante esquema fraudulento liderado pelo sócio majoritário da impetrante, na mesma época em que a aeronave foi adquirida, isso aliado ao fato de que o capital social da impetrante é bastante inferior ao preço pago pela aeronave e de que não foram produzidas provas pré-constituídas da capacidade financeira da impetrante de arcar com tal preço, desconsiderados os aportes ilegais provenientes dos financiamentos bancários fraudulentos, justifica-se a manutenção do gravame sobre o bem, assim como a nomeação de fiel depositário, na medida em que há dúvida sobre a real propriedade do bem e sobre a licitude dos valores usados na sua aquisição.
6. Recurso ordinário a que se nega provimento.
Esta notícia refere-se ao(s) processo(s): RMS 52442