A juíza substituta Bertha Steckert Rezende, em atividade na 4ª Vara Cível de Balneário Camboriú, condenou o proprietário de uma empresa de cereais a indenizar por danos morais, no valor de R$ 21 mil, três pessoas da mesma família que ingeriram larvas junto a lentilha durante um jantar. Segundo os autos, a família comprou um pacote do grão no mercado no dia anterior ao consumo, em julho de 2018, e nada percebeu durante o preparo e o jantar.
Eles começaram a sentir desconforto estomacal somente após a refeição e então descobriram a presença de larvas no pacote de lentilha que haviam acabado de consumir. Em seguida, a família buscou atendimento médico por conta de vômitos e diarreia. Em sua defesa, a empresa alegou que não há provas da venda da lentilha, por falta de nota fiscal ou outro documento, e afirmou não ser possível a lentilha sair da empresa com ovos. Eventualmente, sustentou, pode ter ocorrido armazenamento inadequado no mercado em que o produto foi adquirido.
Segundo a juíza Bertha Rezende, a nota fiscal não é documento indispensável para a propositura da ação – caso assim fosse, isso não lhes daria o direito de reclamar se tivessem recebido o produto de algum familiar ou amigo. “Portanto, com base no que foi explanado e no teor dos artigos supracitados do Código de Defesa do Consumidor, afasto a tese de ilegitimidade ativa das partes”, citou em sua decisão.
A empresa de cereais foi condenada ao pagamento de R$ 8 mil para os dois adultos e de R$ 5 mil para a criança, a título de indenização por danos morais, no total de R$ 21 mil, valor sujeito à correção monetária pelo INPC e ao acréscimo de juros moratórios de 1% ao mês desde a citação, nos termos do art. 405 do Código Civil.
Da decisão cabe recurso ao TJ, o que ocorreu e o mesmo ficou assim ementado:
APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. INGESTÃO DE ALIMENTO IMPRÓPRIO PARA O CONSUMO. PRESENÇA DE LARVAS NO INTERIOR DE EMBALAGEM DE LENTILHA. SENTENÇA DE PROCEDÊNCIA. APELO DA FABRICANTE DO PRODUTO. PRELIMINARES DE CERCEAMENTO DE DEFESA POR NÃO REALIZAÇÃO DA PROVA PERICIAL E DE IMPRESCINDIBILIDADE DE INCLUSÃO DO ESTABELECIMENTO COMERCIAL NO PÓLO PASSIVO DA DEMANDA. ANÁLISE DISPENSADA. DECISÃO DE MÉRITO FAVORÁVEL. PRINCÍPIO DA PRIMAZIA DO JULGAMENTO. EXEGESE DOS ARTIGOS 282, § 2º E 488, DO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL. MÉRITO. ALEGADA INEXISTÊNCIA DE PROVA DE QUE O PRODUTO TENHA SIDO CONTAMINADO NO PROCESSO DE FABRICAÇÃO. ADEMAIS, AFIRMA QUE PELA FOTOGRAFIA DA EMBALAGEM DO PRODUTO NÃO SE VERIFICA QUALQUER IMPUREZA/CORPO ESTRANHO NAS LENTILHAS. SUSTENTADA NÃO COMPROVAÇÃO DO ALEGADO DANO E INEXISTÊNCIA DE NEXO DE CAUSALIDADE, PORQUANTO OS SINTOMAS GASTROINTESTINAIS APRESENTADOS PELOS AUTORES NÃO PODEM SER DECORRENTES DO IMEDIATO CONSUMO DE EVENTUAL PRODUTO IMPRÓPRIO. SUBSISTÊNCIA. INEXISTÊNCIA DA PROVA DOS FATOS CONSTITUTIVOS DO DIREITO. EM QUE PESE SE POSSA VISUALIZAR, PELAS FOTOGRAFIAS APRESENTADAS À INICIAL, A PRESENÇA DE LARVAS NA SOPA PREPARADA COM LENTILHAS. DA FOTOGRAFIA DA EMBALAGEM DO PRODUTO, NÃO SE VERIFICA A PRESENÇA DE QUALQUER CORPO ESTRANHO AO PRODUTO IN NATURA. ELEMENTOS PROBATÓRIOS EM QUESTÃO QUE NÃO SE REVELAM SUFICIENTEMENTE CAPAZES DE FORMAR CONVENCIMENTO QUANTO À CAUSA DO SURGIMENTO DOS ELEMENTOS ESTRANHOS SUPOSTAMENTE PRESENTES NO INTERIOR DA EMBALAGEM. PRODUTO NÃO SUBMETIDO À PROVA PERICIAL. IMPOSSIBILIDADE DE SE PROCEDER A EVENTUAIS ATRIBUIÇÕES DE RESPONSABILIDADES, EIS QUE INCERTA A PRÁTICA DE ATO ILÍCITO. MODIFICAÇÃO DA SENTENÇA. FICA SUSPENSA A EXIGIBILIDADE EM FACE DA JUSTIÇA GRATUITA CONCEDIDA AOS SUPLICANTES. RECURSO PARCIALMENTE CONHECIDO E PROVIDO.
Autos n. 0308545-98.2018.8.24.0005