Penas extintas há mais de cinco anos podem ser consideradas como maus antecedentes em nova condenação

Segundo a decisão, o instituto dos maus antecedentes não é utilizado para a formação da culpa, mas para subsidiar a dosimetria da pena, quando já houve a condenação.

O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que condenações criminais extintas há mais de cinco anos podem ser consideradas como maus antecedentes para a fixação da pena-base em novo processo criminal. De acordo com o entendimento, o instituto dos maus antecedentes não é utilizado para a formação da culpa, mas para subsidiar a discricionariedade do julgador na fase de dosimetria da pena, quando já houve a condenação. A decisão se deu por maioria de votos no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 593818, com repercussão geral reconhecida (Tema 150), na sessão virtual encerrada em 17/8.

Presunção de inocência

O RE foi interposto pelo Ministério Público de Santa Catarina (MP-SC) contra decisão do Tribunal de Justiça estadual (TJ-SC) que não considerou como maus antecedentes, na dosimetria da pena de um sentenciado por tráfico, uma condenação cuja pena fora extinta mais de cinco anos antes. Para o TJ-SC, a consideração da condenação anterior na fixação da pena-base ofenderia o princípio da presunção de inocência, pois seus efeitos não poderiam durar eternamente e, no caso, já havia transcorrido o prazo previsto no artigo 64, inciso I, do Código Penal. O dispositivo diz que, para efeito de reincidência, não prevalece a condenação anterior se, entre a data do cumprimento ou da extinção da pena e a infração posterior, tiver decorrido período superior a cinco anos.

No recurso extraordinário, o MP-SC sustentava que penas extintas há mais de cinco anos, ainda que não sirvam para fins de reincidência, podem ser valoradas como maus antecedentes e que a questão não envolve presunção de inocência.

Reincidência x maus antecedentes

A maioria dos ministros seguiu o voto do relator, ministro Luís Roberto Barroso, proferido em sessão presencial em agosto de 2019. De acordo com seu entendimento, não se deve confundir maus antecedentes com reincidência, pois os institutos se destinam a finalidades distintas na fixação da pena. O primeiro é um requisito valorativo analisado na primeira fase de aplicação da pena, enquanto o outro, por se tratar de uma das circunstâncias agravantes, é aplicado na segunda fase.

Dosagem da pena

Barroso assinalou que os maus antecedentes não são utilizados para a formação da culpa criminal, mas para a dosagem da pena quando já formada a culpa. “Não são uma pecha que acompanha e prejudica a vida do agente, a menos que ele, voltando a delinquir, venha a ser efetivamente condenado pela nova prática delituosa”, disse. Ou seja, para o ministro, ninguém será condenado porque já delinquiu, mas pode ter sua pena dosada à luz desta circunstância individual.

Segundo o relator, os antecedentes se prestam para subsidiar a discricionariedade do julgador na escolha da pena aplicável, do regime inicial de cumprimento da pena privativa de liberdade e da eventual substituição da pena privativa de liberdade por restritiva de direitos. Outro ponto destacado é que a consideração dos maus antecedentes na dosagem da pena concretiza os princípios constitucionais da isonomia e da individualização da pena – o que significa que a pessoa, voltando a delinquir, terá a eventual pena dosada à luz de suas circunstâncias pessoais.

Barroso observou que o sentenciante não está obrigado a sempre majorar a pena quando verificados os antecedentes penais, “mas poderá fazê-lo, fundamentadamente, quando entender que tal providência é necessária e suficiente para a reprovação e prevenção do crime”.

Os ministros Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio, Gilmar Mendes e Dias Toffoli ficaram vencidos ao votarem pelo desprovimento do recurso. Para eles, transcorridos mais de cinco anos desde o cumprimento da pena, o afastamento da reincidência inviabiliza o reconhecimento dos maus antecedentes.

Tese

A tese de repercussão geral fixada no julgamento foi a seguinte: “Não se aplica para o reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal”.

O recurso ficou assim ementado:

DIREITO PENAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. DOSIMETRIA. CONSIDERAÇÃO DOS MAUS ANTECEDENTES AINDA QUE AS CONDENAÇÕES ANTERIORES TENHAM OCORRIDO HÁ MAIS DE CINCO ANOS. POSSIBILIDADE. PARCIAL PROVIMENTO. 1. A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal só considera maus antecedentes condenações penais transitadas em julgado que não configurem reincidência. Trata-se, portanto, de institutos distintos, com finalidade diversa na aplicação da pena criminal. 2. Por esse motivo, não se aplica aos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição previsto para a reincidência (art. 64, I, do Código Penal). 3. Não se pode retirar do julgador a possibilidade de aferir, no caso concreto, informações sobre a vida pregressa do agente, para fins de fixação da pena-base em observância aos princípios constitucionais da isonomia e da individualização da pena. 4. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, mantida a decisão recorrida por outros fundamentos, fixada a seguinte tese: Não se aplica ao reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal.

Tema

150 – Consideração de condenações transitadas em julgado há mais de cinco anos como maus antecedentes para efeito de fixação da pena-base.

Tese

Não se aplica para o reconhecimento dos maus antecedentes o prazo quinquenal de prescrição da reincidência, previsto no art. 64, I, do Código Penal.

Leia mais:

Suspenso julgamento sobre possibilidade de considerar penas extintas como maus antecedentes

Processo relacionado: RE 593818

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