Admitida a flexibilização das regras do parcelamento tributário dada a boa-fé do contribuinte e a ausência de prejuízo para a administração

A 7ª Turma do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1) manteve parcialmente a sentença que determinou à Fazenda Nacional o parcelamento do débito¿remanescente de uma empresa em 161 prestações mensais. A sentença acatou o pedido da autora para que a Fazenda Nacional se abstivesse de exigir o pagamento à vista e expedisse Certidão Positiva de Débitos com Efeitos de Negativa.¿

Conforme verificou o relator do caso, juiz federal convocado pelo TRF1 Roberto Carlos de Oliveira, a sentença afastou a aplicação do artigo 14 da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 02/2011, que estabelece o pagamento em parcela única da diferença entre as parcelas do Refis (Programa de Recuperação Fiscal) e de uma consolidação especial para dívidas federais que foram incluídas apenas no Refis IV devido à aprovação de pedido administrativo da empresa.

De acordo com o magistrado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a aplicação dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade em questões de parcelamentos tributários a fim de evitar práticas contrárias ao propósito da norma de benefício fiscal, especialmente quando se verifica a boa-fé do contribuinte e a ausência de prejuízo para a administração.

Flexibilidade nas regras – Portanto, afirmou que a orientação jurisprudencial do Tribunal, alinhada com a Corte do STJ, é admitir a possibilidade de flexibilidade nas regras formais não essenciais do plano de parcelamento, considerando a boa-fé do contribuinte, a conduta contraditória da administração e a razoabilidade da demanda.¿

O juiz destacou que a autora¿apresentou o pedido de adesão¿de parcelamento fiscal anteriormente, mas alguns dos débitos que ela considerava passíveis de inclusão no programa não foram incluídos na época por erro do sistema, por falta de definição da norma e por inclusão indevida em dívida ativa. Posteriormente, esses débitos foram inseridos no programa, o que atraiu a aplicação do artigo 14, caput, da Portaria n. 02/11, que retroage o vencimento da diferença a partir da data original de conclusão da prestação das informações necessárias à consolidação.¿

O relator concluiu que inexistindo prejuízo à Fazenda Nacional é devida a exigência do saldo devedor, dividido em 161 parcelas, correspondente ao número de prestações restantes na data inicialmente prevista para a consolidação.

O recurso ficou assim ementado:

TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. PROGRAMA DE RECUPERAÇÃO FISCAL – REFIS – LEI 11.941/2009. RECONSOLIDAÇÃO. RECOLHIMENTO DO SALDO DEVEDOR. PRESTAÇÕES RESTANTES NA DATA INICIALMENTE PREVISTA PARA A CONSOLIDAÇÃO, NOS TERMOS DO ARTIGO 3º, § 2º, DA PORTARIA CONJUNTA PGFN/RFB Nº 06/2009.

1. A controvérsia consiste na possibilidade de afastar as “disposições previstas no artigo 14 da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 02/2011, que estabelece o pagamento à vista em uma única parcela da diferença das prestações do REFIS, e para que seja determinado à Delegacia Receita Federal do Brasil em Cuiabá que promova uma consolidação especial para os débitos federais que apenas foram incluídos no REFIS IV em razão do deferimento do pedido administrativo formulado pela empresa nos autos do processo administrativo nº 10183.722584/2011-91 e efetive o cálculo da prestação básica mediante divisão do saldo devedor em 161 prestações mensais” (ID 2288740).

2. A jurisprudência do egrégio Superior Tribunal de Justiça vem reconhecendo, em matéria de parcelamentos tributários, a incidência dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade, a fim de se evitar práticas contrárias à própria teleologia da norma instituidora do benefício fiscal, mormente quando verificada a boa-fé do contribuinte e a ausência de prejuízo para a Administração..

3. A  orientação jurisprudencial firmada nesta Corte, de forma alinhada à do egrégio Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.143.216/RS (julgado sob a sistemática dos recursos especiais repetitivos), é no sentido de admitir a possibilidade de flexibilização das regras formais – não essenciais – do parcelamento, tendo em conta: (i) a boa-fé do contribuinte; (ii) a conduta contraditória da Administração; (iii) a razoabilidade da demanda; e (iv) a ratio essendi do parcelamento fiscal que abrange interesses tanto do contribuinte quanto do próprio Estado (AC 0044615-39.2012.4.01.3800/MG, Rel. Des. Fed. Maria do Carmo Cardoso, unânime, e-DJF1 08/07/2016).

4. Nos termos em que anotado pelo MM. Juízo Federal a quo na v. sentença apelada, verifica-se que “dentre os inúmeros processos administrativos a ser incluídos no parcelamento, sob a modalidade “RFB- Demais Débitos”, a Impetrada reconheceu situação diversa aos mesmos: 1 – alguns estariam regulares e não foram incluídos somente por erro do sistema; 2 – outros não preenchiam, à época, o requisito da definitividade da decisão no prazo avençado, merecendo ser excluídos do parcelamento em um primeiro momento, para, depois, ser admitidos em razão de modificação da Instrução Normativa, que deixou de estabelecer o termo final; 3 – outros estariam indevidamente incluídos em Dívida Ativa e, por tal motivo, sequer foram ofertados ao contribuinte para que fizesse a opção ao parcelamento” (ID 2288815)..

5. Quando do pedido de adesão ao parcelamento, ocorrido em novembro de 2009, a contribuinte apresentou (cf. Anexo III) todos os débitos que reputava passíveis de inclusão no parcelamento. No entanto, a não inclusão dos referidos débitos no programa de parcelamento fiscal no momento da adesão – seja por inadequação do sistema, seja por previsão normativa ou inclusão indevida em dívida ativa-, e sua posterior inserção, de ofício ou por requerimento administrativo, ao atrair a aplicação do art. 14, caput, da Portaria n. 02/11, contraria os princípios da boa-fé administrativa e segurança jurídica.

6.  O egrégio Tribunal Regional Federal da 3ª Região possui o entendimento acerca de que a aplicação literal do art. 14, caput, da Portaria n. 02/11, que retroage o vencimento da diferença a partir da data original de conclusão da prestação das informações necessárias à consolidação”, só é compatível com os princípios da moralidade, boa-fé administrativa e segurança jurídica, quando a não inclusão oportuna seja imputável ao contribuinte. Caso contrário, o vencimento da diferença deve ser reconsolidado a partir do mês de ciência do contribuinte acerca da inclusão de mais débitos. (TRF 3ª Região, QUARTA TURMA, ApelRemNec – APELAÇÃO/REMESSA NECESSÁRIA – 369752 – 0000023-95.2016.4.03.6100, Rel. DESEMBARGADORA FEDERAL MÔNICA NOBRE, julgado em 26/09/2019, e-DJF3 Judicial 1 DATA:10/10/2019).

7. Inexistindo prejuízo à Fazenda Nacional, é devida a exigência do saldo devedor, dividido em 161 parcelas, correspondente ao número de prestações restantes na data inicialmente prevista para a consolidação, nos termos do artigo 3º, § 2º, da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 06/2009.

8. Apelação da impetrante provida.

9. Apelação da Fazenda Nacional e remessa necessária desprovidas.

A 7ª Turma do TRF1, por unanimidade, decidiu acatar o pedido da impetrante e negar provimento à apelação da Fazenda Nacional nos termos do voto do relator.

Processo: 1000075-28.2017.4.01.3600

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