A Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça (STJ) acolheu questão de ordem proposta pelo ministro Mauro Campbell Marques e sobrestou o julgamento de recurso repetitivo que discute a incidência ou não de Imposto de Renda (IR) sobre juros de mora decorrentes de atraso no pagamento de benefícios previdenciários.
Por maioria, em sessão realizada no dia 24 de junho, o colegiado decidiu aguardar o julgamento da mesma controvérsia pelo Supremo Tribunal Federal (STF). Foram tornados sem efeito os dois votos já proferidos no julgamento do recurso, um pela sua rejeição e outro pelo provimento parcial.
Assim, continua suspenso o andamento de todos os demais recursos que tratam da matéria versada no Recuso Especial 1.470.443, no qual a Fazenda Nacional defende a incidência de IR sobre os juros moratórios decorrentes de benefícios previdenciários pagos em atraso pelo INSS, sustentando a inexistência de qualquer dispositivo legal que autorize a isenção do tributo no recebimento de verba indenizatória.
Relatado pelo ministro Mauro Campbell Marques, o recurso foi interposto contra decisão que entendeu que os juros moratórios são, por natureza, verba indenizatória que visa à compensação das perdas sofridas pelo credor em virtude do pagamento extemporâneo de seu crédito e que por tal motivo não estão sujeitos à incidência de IR.
Segundo o relator, o tema é diferente do já enfrentado pela Primeira Seção em recurso repetitivo julgado em 2011, pois este tratava da não incidência de IR sobre juros de mora exclusivamente quando pagos no contexto de despedida ou rescisão do contrato de trabalho.
Repercussão geral
O STF decidirá se é constitucional a cobrança de IR sobre juros de mora incidentes em verbas salariais e previdenciárias pagas com atraso. O tema, com repercussão geral reconhecida por unanimidade no Plenário Virtual da corte, será debatido no Recurso Extraordinário 855.091, de relatoria do ministro Dias Toffoli.
O recurso foi interposto pela União contra acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF4) que declarou a inconstitucionalidade de dispositivos legais que classificavam como rendimentos do trabalho assalariado os juros de mora e quaisquer outras indenizações decorrentes de atraso da remuneração salarial e que admitiam a cobrança de IR sobre essas parcelas.
O acórdão do TRF4 assentou que o parágrafo único do artigo 16 da Lei 4.506/64 (que classifica juros como de natureza salarial) não foi recepcionado pela Constituição de 1988 e declarou a inconstitucionalidade parcial, sem redução de texto, do parágrafo 1º do artigo 3º da Lei 7.713/88 e do artigo 43, inciso II, parágrafo 1º, do Código Tributário Nacional.
O recurso ficou assim ementado:
RECURSO INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DO CPC⁄1973. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 2. RECURSO REPETITIVO. ART. 1.036, DO CPC⁄2015. PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. VIOLAÇÃO AO ART. 535, DO CPC⁄1973. ALEGAÇÕES GENÉRICAS. SÚMULA N. 284⁄STF. IMPOSTO DE RENDA DA PESSOA FÍSICA – IRPF. ANÁLISE DA INCIDÊNCIA SOBRE JUROS DE MORA. ADAPTAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ AO QUE JULGADO PELO STF NO RE N. 855.091 – RS (TEMA N. 808 – RG). PRESERVAÇÃO DE PARTE DAS TESES JULGADAS NO RESP. N. 1.089.720 – RS E NO RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA RESP. N. 1.227.133 – RS. PRESERVAÇÃO DA TOTALIDADE DA TESE JULGADA NO RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA RESP. N. 1.138.695 – SC. INTEGRIDADE, ESTABILIDADE E COERÊNCIA DA JURISPRUDÊNCIA. ART. 926, DO CPC⁄2015. CASO CONCRETO DE JUROS DE MORA DECORRENTES DE BENEFÍCIOS PREVIDENCIÁRIOS PAGOS EM ATRASO. NÃO INCIDÊNCIA DO IMPOSTO DE RENDA.1. Não merece conhecimento o recurso especial que aponta violação ao art. 535, do CPC, sem, na própria peça, individualizar o erro, a obscuridade, a contradição ou a omissão ocorridas no acórdão proferido pela Corte de Origem, bem como sua relevância para a solução da controvérsia apresentada nos autos. Incidência da Súmula n. 284⁄STF: “É inadmissível o recurso extraordinário, quando a deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia “.2. O Supremo Tribunal Federal no julgamento do RE n. 855.091⁄RS (Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, julgado em 15.03.2021), apreciando o Tema n. 808 da Repercussão Geral, em caso concreto onde em discussão juros moratórios acrescidos a verbas remuneratórias reconhecidas em reclamatória trabalhista, considerou não recepcionada pela Constituição Federal de 1988 a parte do parágrafo único do art. 16, da Lei n. 4.506⁄64 que determina a incidência do imposto de renda sobre juros de mora decorrentes de atraso no pagamento das remunerações previstas no artigo, ou seja, rendimentos do trabalho assalariado (remunerações advindas de exercício de empregos, cargos ou funções). Fixou-se então a seguinte tese: Tema n. 808 da Repercussão Geral: “Não incide imposto de renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função”.3. O dever de manter a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça íntegra, estável e coerente (art. 926, do CPC⁄2015) impõe realizar a compatibilização da jurisprudência desta Casa formada em repetitivos e precedentes da Primeira Seção ao que decidido no Tema n. 808 pela Corte Constitucional. Dessa análise, após as derrogações perpetradas pelo julgado do STF na jurisprudência deste STJ, exsurgem as seguintes teses, no que concerne ao objeto deste repetitivo:3.1.) Regra geral , os juros de mora possuem natureza de lucros cessantes , o que permite a incidência do Imposto de Renda – Precedentes: REsp. n.º 1.227.133 – RS, REsp. n. 1.089.720 – RS e REsp. n.º 1.138.695 – SC;3.2.) Os juros de mora decorrentes do pagamento em atraso de verbas alimentares a pessoas físicas escapam à regra geral da incidência do Imposto de Renda, posto que, excepcionalmente, configuram indenização por danos emergentes – Precedente: RE n. 855.091 – RS;3.3.) Escapam à regra geral de incidência do Imposto de Renda sobre juros de mora aqueles cuja verba principal seja isenta ou fora do campo de incidência do IR – Precedente: REsp. n. 1.089.720 – RS.4. Registre-se que a 1ª (3.1.) tese é mera reafirmação de repetitivos anteriores, a 2ª (3.2.) tese é decorrente daquela julgada pelo Supremo Tribunal Federal e a 3ª (3.3.) tese é a elevação a repetitivo de tese já adotada pela Primeira Seção. Já o que seria a 4ª tese (3.4.) foi suprimida por versar sobre tema estranho a este repetitivo (imposto de renda devido por pessoas jurídicas), além do que também está firmada em outro repetitivo, o REsp. n.º 1.138.695 – SC (Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 22.05.2013).5. No caso concreto, as verbas em discussão (juros de mora) decorrem do pagamento a pessoa física de verbas previdenciárias sabidamente remuneratórias e que possuem natureza alimentar (pensão por morte concedida pelo INSS, art. 16, inciso, XI, da Lei n. 4.506⁄64), enquadrando-se na situação descrita no RE n. 855.091 – RS (Tema n. 808), julgado pelo Supremo Tribunal Federal (a segunda tese apresentada acima). Desta forma, não há que se falar na incidência do imposto de renda sobre os juros de mora em questão.6. Recurso especial parcialmente conhecido e, nessa parte, não provido.
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